Quando era mais novo, meu filho dizia secretamente ser um dos Power Rangers. Ele era o vermelho. Me contava que à noite, enquanto dormíamos, saia silenciosamente de casa para “treinar” nas montanhas.
Usei a palavra “secretamente” por que o Flavinho não permitia que divulgasse em nenhum lugar, que não contasse para nenhum amiguinho, nem comentasse na frente da professora que eu era o pai do Power Ranger vermelho.
“Eu não quero ficar dando entrevistas” sussurrava enquanto revirava os olhinhos para ter certeza que não havia nenhum bisbilhoteiro por perto. Eu respeitava a exigência do heroizinho e me calava.
Hoje ele desmente. Diz que era bobagem, coisa de criança e depois pergunta “Será que eu acreditava mesmo nessa história?”.
A gente sempre acredita. Agora nessa fase que está (de pré adolescência) a idealização de super herói muda.
Eles competem no Minecraft, querem ser independentes, colocam-se tantas vezes em posição de enfrentamento, de questionamentos, enquanto se esforçam para disfarçar os medos, as necessidades, as dúvidas de meninos, que ainda são.
Pensam que é preciso colocar a fragilidade de lado e assumir o controle das coisas. Estão crescendo, são quase jovens, tem o mundo todo a ser conquistado.
Conheço esse caminho. Sei que daqui para frente as demandas cada vez maiores forçarão rupturas e vão gerar movimentos que os distanciarão de casa, dos pais, dos sonhos de meninos, da simplicidade tão linda.
A vida faz isso com a gente. Nos convence que agora somos pais, profissionais, maridos, provedores, super heróis cheios de força, de poder, de sabedoria, até que o inesperado nos exponha a realidade e nos chame de volta. Diante da realidade percebemos que não eramos o que pensávamos ser.
Ser herói não é pensar que é forte. Ser herói é ser humano. É nos vincularmos em nossas fraquezas, atentos uns aos outros, abertos, disponíveis à vida.
Quanto mais simples, mais humano. Quanto mais humano, mais sensível. Quanto mais sensível, mais claro que não preciso ser forte o tempo todo. Desistirei de corresponder às expectativas e me pacificarei com quem sou, com quem sei ser hoje.
Não preciso ser o Power Ranger vermelho, nem o super homem, nem o mestre iluminado, nem a referência de ninguém.
Serei eu mesmo, do jeito que posso, do jeito que dá, consciente que todos os processos humanos podem me lembrar que minha força não está necessariamente no poder de resistência, mas na capacidade de chorar, sofrer, perder e não ficar lá. Levantar, seguir adiante e acreditar que dias melhores sempre virão. E eles sempre vem.
Fonte Flávio Siqueira