Área econômica do governo vê possibilidade de aumento como ameaça à credibilidade do teto de gastos, mas PGR quer viabilizar medida
Um despacho do Tribunal de Contas da União (TCU) acendeu um alerta na equipe econômica para o risco de Judiciário e Ministério Público elevarem suas despesas em R$ 1,5 bilhão sem esbarrar no teto de gastos, que limita o avanço das despesas à inflação.
A corte de contas reconheceu que o Ministério Público da União pode incorporar ao seu orçamento limites retroativos não concedidos no teto de gastos em 2017 e 2018. Na prática, o MPU vai poder gastar mais R$ 228,5 milhões neste ano, como julgar mais conveniente. O Judiciário também poderá ser beneficiado, caso peça o mesmo tratamento, por isso o risco do impacto bilionário.
A decisão teve a oposição da área técnica do tribunal, segundo apurou o Estadão/Broadcast. Na área econômica do governo, a ideia foi vista como uma ameaça à credibilidade do teto, considerado hoje uma “superâncora” para dar segurança a investidores em momento de forte elevação das despesas devido à covid-19.
A efetivação do gasto ainda dependerá de o governo enviar um projeto ao Congresso Nacional para abrir o crédito suplementar necessário às novas despesas do MPU. Os parlamentares podem aprovar ou não esse crédito.
O despacho do ministro do TCU, Bruno Dantas , determinou ao governo reconhecer o erro no cálculo do teto, mas não obrigou o envio do projeto que autoriza a despesa adicional. Nos bastidores, o procurador-geral da República, Augusto Aras , já tem pressionado para que a proposta seja enviada para viabilizar os novos gastos. Como mostrou o Estadão, o PGR tem tomado uma série de medidas que atendem aos interesses do presidente Jair Bolsonaro , o que lhe garantiu “pontos” junto ao Palácio do Planalto .
A Secretaria de Orçamento Federal (SOF) do Ministério da Economia chegou a questionar Dantas sobre qual seria o procedimento mais adequado para conceder o limite retroativo. O ministro, porém, disse que “o governo não pode misturar dois temas para terceirizar ao TCU uma responsabilidade que não é dele” e avaliou que a definição da dotação orçamentária não é questão a ser resolvida pela corte de contas neste momento.
A PGR já tem planos para o dinheiro e deve usá-lo para bancar o custeio de unidades, com pagamento de passivos, retomada de obras e aquisição de novas sedes para reduzir gastos com aluguel.
Impasse
A natureza do impasse vem do fim do ano passado, quando o plenário do TCU ordenou ao Ministério da Economia a revisão do cálculo do teto de gastos dos demais poderes para incorporar, em sua base (despesas pagas em 2016), gastos com auxílio moradia realizados em 2016 e que foram autorizados por meio de um crédito extraordinário aberto pela ex-presidente Dilma Rousseff ( PT ) no valor de R$ 419,5 milhões.
O crédito extraordinário é um instrumento usado para abrir espaço no Orçamento para despesas imprevistas e, por isso, fica de fora do alcance do teto desde sua criação, em 2017. Por essa lógica, a equipe econômica havia excluído despesas de créditos extraordinários da base de cálculo do limite.
O uso desse instrumento para pagar uma despesa recorrente (auxílio moradia) foi considerado indevido pelo TCU, mas a corte de contas entendeu que a forma adotada não anulava o fato de que era uma despesa paga no ano de referência para o teto. Com isso, mandou o governo incorporar o valor de R$ 105 milhões na base de cálculo do limite do MPU.
O Ministério da Economia fez os ajustes em 2019 e 2020, mas o ministro Bruno Dantas emitiu um despacho esclarecendo que o Executivo precisa fazer a compensação dos retroativos de 2017 (R$ 112,6 milhões) e 2018 (R$ 116 milhões).
“Esses valores aos quais o MPU não teve acesso devem retornar ao órgão para que ele, em querendo, possa utilizá-los e solucionar dificuldades que foram geradas desde 2017, tendo em vista a restrição indevida”, diz o ministro no despacho.