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sexta-feira 22 novembro 2024
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Sou muitos. Estou sendo.


Sou o menino tímido, com olhar triste, que gostava de olhar para o céu e ver quadros antigos. O adolescente que jogava futebol, que brincava com os amigos, que amava aviões.

Sou o jovem arrimo de família que trabalhava até de madrugada e uma vez chorou na cama, à noite, cansado por tudo, sem disposição para sair de casa no fim da noite, pegar um ônibus e entrar na rádio à meia noite.
A experiência da estafa sendo interrompida por meu pai chegando em casa e surpreendentemente nos dizendo que doaria o carro que era do meu avô, ainda vive em mim. Minha vida melhoraria naquela noite.
Sou o pai da minha mãe, dos meus irmãos, mesmo quando entendi que era hora de deixar de ser. Sou o filho que ainda escuta o canto, as palavras, o amor de mãe expressos em tantos cuidados, em tanta dedicação, com tanta, tanta, tanta eloquência.
Não deixei de ser o irmão sempre tão próximo em idade, em percepções, em entendimento da vida. Eu e meu irmão somos cada vez mais irmãos, cada vez mais amigos.
Sou aluno da minha irmã. Em cada encontro me convenço que, bem mais do que ela, sou eu que aprendo com seu jeito absolutamente único, simples, despretensioso, ingênuo e sábio de valorizar apenas o que importa.
Em meu pai identifico a vontade de aprender, a capacidade de nunca desistir, a esperança que superar limites. Com ele aprendo a prosseguir.
No último fim de semana me lembrei de tudo isso. Sentados ao redor de uma mesa, comendo a comida preparada cuidadosamente por minha mãe, rindo com piadas antigas e desencavadas, tentando nos lembrar quanto tempo fazia desde que estivemos assim pela última vez. Tantas coisas aconteceram, tantas coisas mudaram, fizemos tantos caminhos.
Mas tem coisas que não mudam.
Enquanto estivemos juntos me lembrei de quem sou. Sou todos eles, sou todos que fui, sou quem serei, reflexo de cada influência, cada encontro, cada desencontro.
Na segunda feira nos despedimos logo depois do almoço. Falamos sobre novos encontros, sobre não deixar que tantos anos passem.
No voo da volta eu pensava em tudo. Na chance que a vida nos deu, no reconhecimento que, apesar das mudanças, ainda somos os mesmos. Voltei para casa com a clara sensação que é nos afetos onde existimos, especialmente nos que são maiores que o tempo, que jamais se dissolvem, que me lembram quem sou, quem estou sendo, quem um dia vou ser. – 

Fonte Flavio Siqueira




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