Doença já provocou mais de 2.000 mortes na China
“Estou aliviado. Quero descansar”, declarou um japonês de 77 anos, que pretendia usar o transporte público para voltar para sua casa. “A vida a bordo era cômoda, estou bem”, respondeu ao ser questionado sobre a quarentena.
Vários ônibus da cidade de Yokohama e alguns táxis aguardavam os passageiros. Alguns acenaram para as pessoas obrigadas a permanecer no navio. O número de infecções a bordo do navio de cruzeiro, atracado no porto de Yokohama, alcançou pelo menos 542 na terça-feira, o que provocou muitas críticas sobre a gestão da quarentena por parte das autoridades nipônicas.
As 3.711 pessoas de 56 países a bordo faziam um cruzeiro pela Ásia que virou um pesadelo, entre o medo de contrair uma pneumonia viral que pode ser fatal e o tédio do confinamento em suas cabines, algumas delas sem janela, e com uma caminhada curta no convés como única distração. “Mais uma vez nosso reconhecimento para a tripulação e o capitão por sua incrível atenção durante esta crise épica”, tuitou Yardley Wong, confinado com seu filho de seis anos. “Se você e sua companhia de cabine apresentam resultados negativos e não apresentam sintomas respiratórios ou febre podem se preparar para desembarcar”, anunciaram as autoridades na terça-feira aos passageiros em uma carta. A operação deve demorar três dias.
“Preocupação”
David Abel, um passageiro britânico que ganhou fama com os vídeos publicados no início da quarentena, descreveu o estado de ânimo dos passageiros confinados. “O mais duro é não saber o que vai acontecer. Começa a nos afetar mentalmente. É muito difícil se concentrar em algo”, disse Abel. Algumas horas depois, o britânico anunciou que o exame de sua esposa Sally deu positivo. Fora da província chinesa de Hubei, “a epidemia afeta uma proporção muito pequena da população”, afirmou na segunda-feira Michael Ryan, diretor de emergências da Organização Mundial da Saúde (OMS).
Fora da China continental foram registrados 900 casos e apenas cinco mortes (na França, Japão, Filipinas, Taiwan e Hong Kong). O “Diamond Princess” é, ao contrário, o principal foco de portadores do vírus depois da China, com mais infectados que o restante do planeta. A cada dia são detectados dezenas de novos casos a bordo, o que provocou críticas à eficácia da quarentena, durante a qual os passageiros eram autorizados a caminhar em pequenos grupos pelo convés, de máscaras.
Os tripulantes distribuíam comida pelas cabines. Kentaro Iwata, professor do departamento de doenças infecciosas da Universidade de Kobe, entrou no “Diamond Princess” e chamou de “totalmente caótica” a gestão da quarentena por parte do governo. O professor disse que teve medo como nunca havia sentido em sua carreira, uma crítica pública pouco habitual no país.
Depois de batalhar por uma autorização das autoridades, Iwata subiu no cruzeiro na terça-feira. “Este navio é totalmente inapropriado para o controle da propagação de infecções. Não há distinção entre zonas verdes (saudáveis) e vermelhas (potencialmente infectadas) e os funcionários podem circular de um lugar para outro, comer, usar o telefone”, relatou. “Eu estive na África para trabalhar durante a epidemia de ebola. Estive em outros países afetados pelo cólera, na China em 2003 para tratar a Sars (…) Nunca tive medo de contágio”, afirma em um vídeo em inglês. “Mas dentro do Diamond Princess tive medo, porque não há nenhuma forma de dizer onde está o vírus”. Ele ficou tão preocupado que decidiu permanecer em quarentena por 14 dias pelo medo de contagiar sua família.
Iwata lamenta que a gestão da crise tenha ficado inicialmente nas mãos de burocratas, sem a presença de um especialista em gestão de infecções. Das quase 2.400 pessoas submetidas a exames no navio, 542 deram resultado positivo para o coronavírus Covid-19. Alguns resultados ainda não foram divulgados.
O ministro japonês da Saúde, Katsunobu Kato, rebateu as críticas. “Médicos especialistas que integram uma equipe de prevenção de infecções monitoram o navio”, afirmou. Ele disse ainda que os especialistas que assessoram o governo consideram a situação “sob controle”. Vários países decidiram enviar aviões para repatriar seus cidadãos. A tripulação será submetida a um período de quarentena depois que o último passageiro deixar o navio.
Correio do Povo