Animais só devem voltar a se movimentar a partir de quinta ou sexta-feira
A nuvem gigante de gafanhotos que estacionou desde sábado em Entre Ríos, na Argentina, a cerca de 100 quilômetros da divisa do Rio Grande do Sul e a 10 quilômetros do Uruguai, só deve se movimentar novamente a partir de quinta ou sexta-feira, quando as baixas temperaturas na região voltarem a subir para a casa dos 25 ou 30 graus centígrados. A avaliação é do entomologista Dori Edson Nava, do Núcleo de Fitossanidade da Embrapa Clima Temperado, unidade de pesquisas localizada em Pelotas (RS), que acompanha a movimentação dos insetos. O deslocamento dos insetos e uma eventual chegada deles ao Brasil preocupa autoridades do Ministério da Agricultura.
Com a onda de frio na região, que registra temperaturas mínimas de 5 graus e máximas de 20 graus, neste último final de semana, autoridades sanitárias argentinas intensificaram o combate aos insetos e conseguiram reduzir em até 85%” o volume de gafanhotos no local. A nuvem era calculada em cerca de 400 milhões de insetos, alcançando 10 km2, segundo informes da Senasa, órgão de controle do setor no país vizinho.
A ação contra os gafanhotos no local ocorreu com uso de inseticidas por aviões, mais a ajuda de pulverizadores movidos por tratores dos produtores da região. “Somente quando a temperatura voltar a subir, lá por quinta-feira ou sexta, é que poderemos saber se o grupo vai voltar a se mover e em qual direção”, explicou o pesquisador da Embrapa, que acompanha as informações sobre o deslocamento da nuvem formada na região do Chaco, e que migrou para o sul do continente.
Ciclos
Para o entomologista da Embrapa, porém, a aglomeração dos insetos é um problema ambiental regional que, quando ocorre, pode ter um ciclo que vai de 8 a 15 anos a partir de longos períodos de temperaturas altas. Ele explicou que o atual ciclo tem apresentado temperaturas mais altas nos últimos 4 anos na região, que vai do norte da Argentina à Bolívia, passando pelo Paraguai. A ocorrência dessas temperaturas mais altas projeta, portanto, uma possível existência de pragas ainda por um período de mais 4 a 5 anos, argumentou o pesquisador da Embrapa.
Nestes casos, segundo Nava, em vez dos dois ciclos reprodutivos anuais, verão e inverno, o gafanhoto pode produzir uma terceira geração de filhotes no ano. Ele lembrou que a Argentina já registrou em 2020 “outras cinco ou seis nuvens” e que há pelo menos outras duas aglomerações do inseto em formação. “Uma, na província de Formosa, na Argentina, e uma outra, mais recente, que se formou num parque no Paraguai”, disse.
Nava explicou também que há mais duas hipóteses para a formação do acúmulo dos gafanhotos, além da ideia de ocorrência de proliferação por conta de ondas de temperaturas mais elevadas. A segunda hipótese, segundo o entomologista, é a de que o gafanhoto possa ter sido favorecido na luta natural contra outras espécies no meio ambiente. E a terceira teoria, que tem componentes econômicos: “Quando o valor de mercado dos produtos agrícolas é bom, o produtor segue todas as regras de controle, mas quando há anos nos quais há secas e o preço dos produtos cai”, prosseguiu o cientista. “isso desestimula o produtor e ele reduz os controles recomendados, o que faz com que o inseto aumente a sua população”.
Segundo o entomologista, quando a população de gafanhotos aumenta muito na região do Chaco, o inseto fica sem comida e é estimulado a migrar. “Ele tem um comportamento gregário, consegue formar grupos, essas nuvens, e ele migra para se alimentar e também para se reproduzir”, contou. O pesquisador argumentou que os técnicos que acompanham a movimentação das nuvens na Argentina informam que a nuvem que está em Formosa, próxima da divisa com Assunção, capital do Paraguai, é ainda maior do que aquela que atualmente preocupa as autoridades em Entre Ríos. “Pelo que o pessoal tem comentado nos grupo, essa é maior e tem cerca de 20 km2”, disse Nava.
A novidade, neste caso, é que essa nuvem estaria se descolando não no sentido do Brasil, nas indo na direção da província de Santiago Del Estero, para o lado da Cordilheira dos Andes, localizou o pesquisador. A outra nuvem, do parque no Paraguai, foi encontrada há uma semana, mas ainda não foi dimensionada. “O local é de difícil acesso, com vegetação baixa, espinhosa, uma área semidesértica no Paraguai”, explicou Nava.
Ele argumentou ainda que, nesta época do ano, há poucas culturas no campo. O plantio de soja, milho, arroz, por exemplo, segundo Nava, só vai começar a partir de setembro e outubro. “O que se tem agora são os cereais de inverno, trigo, centeio e cevada, pastagens e algumas frutíferas”, afirmou. Nava não quis fazer projeção de prejuízos. “Ainda não dá para quantificar prejuízos”, alegou. “Fala-se de um milhão de dólares por dia, mas esse é o cálculo levando-se em conta a pior situação no pior cenário. É preciso aguardar”, afirmou. Segundo ele, as próprias autoridades argentinas dizem que a nuvem assusta mais do que o estrago que ela faz, ela impressiona mais pelo tamanho do que o dano causado. Mas é preciso acompanhar”, alertou.