O DESTINO DE RAMIRO –
………Na década de 60, morava na Rua Tiradentes, da minha terra natal (Sarandi-RS), um guri de pele parda, filho adotivo.
Ele era visto no pátio de minha casa, jogando bolitas… na calçada e no pátio da casa dele, jogando bola.
O Pai dele, por força da profissão (motorista de caminhão), passava vários períodos longe de casa.
Meu Pai chamava-o de RAMIRO.
Eu achava engraçado.
Ele queria seguir a profissão do Pai. Este tinha na garagem um caminhão Mercedes-Benz, de cabine azul. O RAMIRO gostava de brincar de “caminhãozinho”.
O Pai dele plantou árvores frutíferas e construiu um parreiral para ele comer uvas.
Ele estudava no melhor colégio da cidade, a Escola Normal Rural Santa Gema Galgani, o “Colégio das Irmãs”.
A vida estava valendo a pena!
Ele era alegre e esperto.
No pátio dos fundos, havia um pequeno campo de futebol, cheio de amigos.
Ele foi um bom amigo de infância!
Na primavera de 1963, quando ele tinha 10 anos, passou a ser perseguido por alguns rapazes de classe média.
Queriam pegá-lo na saída das aulas da tarde.
Ficavam na quadra do Ginásio esperando ele passar.
Estavam determinados.
Era uma questão de tempo…
Sabendo da intenção dos “grandes”, decidiu contornar o Ginásio, dando a volta pelo lado de cima. Mesmo assim, foi alcançado.
Pegaram ele pelo braço e levaram-no a um local ermo.
Na grama, a pasta de couro marrom, aberta, com um caderno e uma caixinha de lápis de cor…
Os rapazes, indiferentes às lágrimas e ao medo do menino, revezavam-se, sem parar…
No dia seguinte, a mãe do RAMIRO me disse: “Meu filho chegou em casa todo lambuzado!
Dei queixa na Polícia!”.
Ela era uma das primeiras a ir à Escola para saber se o filho tinha passado de ano.
Os pais dele não mereciam tamanho desgosto!
O caso foi abafado.
Filhos de gente importante estavam envolvidos.
A Cidade perdeu uma grande oportunidade de aplicar uma punição exemplar, educativa.
A Sociedade não era santa.
Surgiam casos de alcoolismo e adultério.
Afinal, a carne é fraca.
Mas, naquele dia, a Cidade chegou no fundo do poço!
Só a educação das pessoas poderá evitar que casos semelhantes aconteçam!
A Matemática não é tudo!
O Português tampouco é tudo!
O ser humano precisa ser íntegro!
………Agora, o RAMIRO, traumatizado e com sequelas, olha pela janela.
Outros guris brincam lá fora. A vida continua.
O filho adotivo tem o direito de ser feliz!
Deve ser amado e respeitado; nunca discriminado!
Apesar de tudo, é preciso seguir em frente… com a esperança de dias melhores.