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sábado 23 novembro 2024
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Conad aprova política nacional de drogas contra “iniciativas de legalização”

Resolução indica inclusão de comunidades terapêuticas e religiosas para acolher dependentes

Osmar Terra coordenou confecção de relatório | Foto: Wilson Dias / ABr / CP

Osmar Terra coordenou confecção de relatório | Foto: Wilson Dias / ABr / CP

Vinculado ao Ministério da Justiça e composto por representantes da sociedade civil e do governo federal, o Conselho Nacional de Políticas Sobre Drogas (Conad) aprovou nesta quinta-feira resolução que, embora não tenha força de lei, pode resultar em mudanças práticas na política nacional sobre drogas, principalmente no que diz respeito à atuação das chamadas comunidades terapêuticas. A resolução foi aprovada por 16 dos 28 conselheiros. As recomendações incluem no texto “atender à posição majoritariamente contrária da população em relação às iniciativas de legalização das drogas”, o que gerou críticas.

Segundo o autor da proposta, ministro do Desenvolvimento Social, Osmar Terra, a resolução é também uma sinalização da nova orientação do governo federal sobre o tema. “A política que o governo vai adotar a partir desta resolução é diferente. A lei em vigor tem se revelado fraca no sentido de conter a epidemia de uso de drogas, mesmo que proibindo-as. Esta resolução amplia a forma de agir nas políticas públicas em relação às drogas […]. É uma manifestação não só do conselho, mas do governo, já que os votos do governo [no Conad] foram unanimemente contrários a uma política de liberação das drogas”, disse Terra.

O ministro disse que o atual modelo de acolhimento, tratamento e reinserção social que orienta o atendimento a dependentes químicos em unidades públicas de saúde é “extremamente proibicionista e restritivo” em relação ao trabalho das comunidades terapêuticas e grupos de mútua ajuda que, segundo ele, “são os que conseguem algum resultado” efetivo no tratamento da dependência química.

“Milhares de pessoas em todo o país são capacitadas a cuidar de dependentes químicos por um manual que proíbe falar em abstinência, mas a redução de danos, sozinha, tem um resultado pífio, não só para a vida do dependente químico, como para a de toda a sua família. A partir de agora, todo o material que for produzido pelo governo e toda capacitação de profissionais vai ser diferente, colocando questões que não vinha sendo colocadas, como a promoção da abstinência”, acrescentou o ministro.

Classificando o uso de substâncias psicoativas ilícitas como uma epidemia, Terra revelou que espera que o Congresso Nacional aprove, em breve, o Projeto de Lei Complementar (PLC) 37, em análise no Senado. “A violência está se propagando e a própria política do governo federal de enfrentamento a essa violência exige que se faça alguma coisa na política sobre drogas. Espero que o Congresso Nacional aprove, em pouco tempo, uma nova política sobre drogas, aumentando o rigor no enfrentamento”, disse o ministro.

Para Osmar Terra, o PLC 37 inclui “avanços” na atual legislação. “É o caso da possibilidade de internação involuntária, que já existe na chamada Lei Antimanicomial para surtos psicóticos. Uma pessoa que está na Cracolândia fumando uma pedra de crack sem parar não tem a mínima capacidade de avaliar sua própria situação. A internação será feita a pedido do médico, acompanhado pelo Ministério Público, e apenas para desintoxicação”, explicou.

Pela resolução aprovada nesta quinta-feira, o realinhamento da política nacional sobre drogas deve levar em conta os projetos de alteração das leis que tramitam no Congresso Nacional, as recentes decisões do Poder Judiciário e a necessidade de contínuo aprimoramento das ações públicas de prevenção, acolhimento, formação, pesquisa, cuidado e reinserção social no campo das políticas sobre drogas. A norma também estabelece que qualquer mudança considere a formalização da rede nacional de mobilização comunitária e apoio aos familiares, em articulação com grupos e entidades da sociedade civil organizada cuja atuação seja reconhecida. Além disso, a União deve promover o fomente à rede de suporte social, composta por essas organizações da sociedade civil.

Um dos pontos criticados por conselheiros contrários à proposta foi o que diz que o realinhamento da política nacional deve levar em conta também a “posição majoritariamente contrária da população em relação às iniciativas de legalização das drogas”. Para os que discordaram, não há pesquisas oficiais ou confiáveis sobre a posição da maioria dos brasileiros. O texto, no entanto, foi mantido.

Conselheira vê retrocesso

A representante do Conselho Federal de Serviço Social, Fabíola Xavier Leal, disse que a aprovação da resolução é um retrocesso aos olhos de quem defende uma política progressista. “Significa um retrocesso de mais de 20 anos. Reforça o uso da abstinência como única possibilidade de tratamento, desconsiderando o que apregoa a reforma psiquiátrica, que é o recurso à redução de danos”, afirmou Fabíola.

Para a conselheira, o objetivo é “fortalecer as comunidades terapêuticas de cunho religioso em detrimento de toda a rede de atenção psicossocial”. Além disso, ressaltou Fabíola, “desse modo, inviabiliza-se qualquer debate sobre a regulação das drogas no Brasil, usando informações e dados que não se fundamentam.”

Já o representante do Conselho Federal de Medicina, Antônio Geraldo da Silva, afirmou que a população brasileira ganha com a aprovação da resolução. “Teremos uma política realmente voltada para a redução do número de dependentes químicos, um indicativo para estados e municípios. Com essa proposta, poderemos trabalhar para buscar a abstinência, e não apenas a redução da quantidade de álcool ou drogas. E jamais em favor de uma legalização ou descriminalização das drogas, o que seria um retrocesso”, disse o psiquiatra.

Ele enfatizou que, na prática, nos equipamentos públicos, os profissionais orientavam os dependentes químicos a diminuir o consumo, e não a tentar superar o vício. “Isso vinha sendo implantado através de cartilhas, de orientações aos profissionais, o que é um erro. A redução de danos pode ser um meio para atingirmos o que buscamos, que é a abstinência.”

O representante do terceiro setor, Haroldo Jorge Praciano Pereira, que falou em defesa das Santas Casas de Misericórdia e entidades filantrópicas, também aprovou a nova resolução do Conad.  “É uma medida legal que dará segurança jurídica para as Santas Casas e entidades firmarem contratos com entes públicos a fim de ofertarmos atendimento aos dependentes químicos e a suas famílias. Já prestamos esses serviços, mas sozinhos”, disse Praciano, que destacou a importância de uma legislação que permita trabalhar junto com o Estado, ao qual as filantrópicas podem dar grande apoio. Pereira disse que é favorável ao endurecimento no combate às drogas ilícitas.

Correio do Povo




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