Polícia do Rio analisa registros que indicam que suspeito visitou condomínio do presidente no dia do crime
O presidente Jair Bolsonaro concedeu uma entrevista exclusiva à Record TV na noite desta terça-feira, em Riad, na Árabia Saudita, onde reagiu a divulgação da informação de que a Polícia Civil do Rio de Janeiro está investigando o suposto envolvimento do presidente com Ronnie Lessa, suspeito de ter matado a vereadora Marielle Franco, e o motorista Anderson Gomes, no centro do Rio, no ano passado.
Bolsonaro apontou falhas no processo e uma interferência do governador do Rio de Janeiro, Wilson Witzel. Ele disse que tem interesse em colaborar com a investigação. “Gostaria muito de ser ouvido. Sei que tenho imunidade, mas não tem problema, estou disposto a ser ouvido nesse processo. Acho que ele está sendo mal conduzido. Eles querem jogar uma cortina de fumaça. Em parte, querem jogar para cima de mim a responsabilidade dessa execução”, afirmou.
Pouco antes de falar à Record, o presidente fez uma transmissão nas redes sociais onde, em tom mais elevado, se disse vítima de perseguição e apontou o que seriam as falhas na Polícia carioca. “Ou o porteiro mentiu, ou o induziram a cometer falso testemunho, ou escreveram algo no inquérito que ele não leu e assinou embaixo confiando no delegado”, sugeriu, ao classificar a investigação como falha. “Pelo que tudo indica esse processo está ‘bichado.”
Bolsonaro também questionou como o processo em segredo de Justiça acabou sendo vazado para a imprensa. Ao relacionar o vazamento a Witzel, teceu várias críticas ao político. “O senhor só se elegeu como governador porque ficou o tempo todo colado com o Flávio, meu filho. Ao chegar na Presidência, o que o senhor fez? Tornou-se inimigo dele. Por quê? Porque o senhor quer disputar a Presidência em 2022. Legítimo. Mas, para chegar lá, ao que tudo indica, o senhor tem que destruir a família Bolsonaro. Destruir naquilo que temos de mais sagrado. É a nossa conduta de combate a corrupção e honestidade”, afirmou.
Ele também defendeu os filhos, alvos de investigações. “A questão do Flávio está nas mãos da Justiça. E ele vai se defender. Mas o sigilo fiscal e bancário tem que ser quebrado apenas com decisão judicial”, ponderou.
Investigação
A Polícia Civil do Rio de Janeiro analisa o registro da portaria do condomínio onde morava Ronnie Lessa, suspeito de ter matado a vereadora Marielle Franco, e o motorista Anderson Gomes, no ano passado. É o mesmo condomínio onde o presidente tem dois imóveis. De acordo com matéria do Jornal Nacional, da TV Globo, um homem, identificado como Élcio Vieira Queiroz, teria chegado na portaria por volta das 17h10min em 14 de março do ano passado. Ao porteiro, ele teria dito que iria na casa 58, que pertence ao presidente Jair Bolsonaro. A citação do nome do presidente torna obrigatório que Supremo Tribunal Federal (STF) analise o caso.
O porteiro, em depoimento à Polícia em duas ocasiões, disse que teria ligado para a casa 58 e falado com um homem, que ele, porteiro, teria reconhecido como sendo a voz de “seu Jair”. Pelas câmeras de segurança do condomínio, o porteiro teria visto que o carro foi para a residência de Lessa e teria, segundo a Polícia, avisado ao morador da casa 58 que teria lhe respondido que sabia.
Porém, registros na Câmara, em Brasília, comprovam que Bolsonaro participou de sessões no Parlamento às 14h30min e às 20h30min, o que tornaria impossível a presença do então deputado federal em sua casa no Rio. Inclusive a presença de Bolsonaro foi registrada por meio de sua digital no equipamento do Congresso. Além disso, Bolsonaro também fez algumas selfies do lado de fora de seu gabinete, com pessoas que foram visitar o local.
A polícia tenta recuperar arquivos de áudio da guarita do condomínio, cujo interfone é monitorado, para saber com quem, de fato, o porteiro conversou naquele dia e quem estava na casa 58. Com a citação pelo porteiro do nome do presidente, representantes do Ministério Público do Rio foram a Brasília no último dia 17 para fazer consulta ao presidente do STF, Dias Toffoli. Eles questionaram se podem continuar com investigações, uma vez que o nome de Bolsonaro foi mencionado. Toffoli ainda não respondeu.
O advogado de Bolsonaro, Frederick Wassef, contestou o depoimento. Ele ressaltou que o presidente estava em Brasília no dia do assassinato de Marielle e disse que o depoimento do porteiro é uma “mentira”, feita para atacar a imagem e a reputação de Bolsonaro. “Afirmo com absoluta certeza que é uma mentira, fraude, farsa para atacar imagem e reputação do presidente”, disse Wassef. “O presidente não conhece o Élcio.” “Talvez, esse indivíduo tenha ido à casa de outra pessoa e, alguém, com intuito de incriminar o presidente, conseguiu um depoimento falso onde essa pessoa afirma que falou com Jair”, declarou o advogado.
Já Jair Bolsonaro pediu que seja investigado como a TV Globo teve acesso ao processo, uma vez que ele corre em segredo de Justiça, além de classificar a matéria como perseguição. “Será que a Globo está criando uma narrativa de que eu deveria me afastar ou o povo deveria ir às ruas pedir meu afastamento?”, ironizou. Segundo ele, tudo não passa de uma intenção de atacar a ele e a sua família. “Ficam o tempo todo em cima da minha vida e da dos meus filhos”, destacou. Ele sinalizou, ainda, que poderá analisar “com todo o cuidado” o processo de concessão da rede de televisão, que vence em 2022.