Perda de fôlego da atividade global está relacionada ao quadro de inflação elevada
A volatilidade deu o tom aos negócios no mercado de câmbio doméstico na sessão desta segunda-feira, 11, embora o sinal de baixa tenha prevalecido no fim do pregão, com o dólar à vista fechando novamente abaixo de R$ 4,70, diante da perspectiva de extensão do ciclo de alta da taxa Selic após declarações do presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto.
O dia lá fora foi marcado por temores de perda de fôlego da atividade global em meio a um quadro de inflação elevada, a chamada estagflação.
Na China, que enfrenta um lockdown em Xangai, seu centro financeiro, índices de inflação ao consumidor e produtor vieram acima do esperado. Bolsas e petróleo caíram, com o barril tipo Brent, referência para a Petrobras, abaixo dos US$ 100 o barril.
Na expectativa por um ajuste mais intenso da política monetária americana, em meio a discursos de dirigentes do Federal Reserve, a taxa da T-note de 10 anos subiu a 2,78% e o índice DXY – que mede o desempenho dólar frente a uma cesta de seis divisas fortes – chegou a superar os 100,00 pontos na máxima.
Por aqui, o dólar não conseguiu firmar tendência pela manhã e no início da tarde, apresentando trocas constantes de sinais, embora tenha oscilado apenas cerca de cinco centavos entre a mínima (R$ 4,6799) e a máxima (R$ 4,7399). Apesar do clima externo avesso ao risco, divisas emergentes pares do real – como o peso mexicano e o rand sul-africano – se fortaleceram.
Ao mau humor externo também se contrapôs a possibilidade de que o Banco Central estenda o ciclo de aperto monetário para além de maio e jogue a Selic para perto de 14% – o que contribui para manter a atratividade do carry trade (operações que exploram diferencial de juros entre países.
Em evento pela manhã, Campos Neto afirmou que a “inflação está muito alta”, incluindo os núcleos, e que o BC está “analisando a surpresa no IPCA para ver se muda algo na tendência”, em referência a alta de 1,62% do índice em março. O BC havia sinalizando anteriormente, tanto em documentos como em falas do próprio Campos Neto, encerramento do ciclo com alta final da Selic em 1 ponto porcentual, para 12,75% em maio.
Após idas e vindas, nas duas últimas horas da sessão, o dólar se firmou em baixa e rompeu o piso de R$ 4,70, para fechar a R$ 4,6904, recuo de 0,39%. A divisa acumula queda de 1,49% em abril e de 15,88% no ano.
O economista Bruno Mori atribui a máxima do dólar na sessão às incertezas em torno de uma desaceleração da economia global, espelhada na queda das commodities.
A sinalização de Campos Neto de que o aperto monetário pode se estender acabou, contudo, se sobrepondo aos preocupações externas na formação da taxa de câmbio.
“Com esse cenário de alta adicional de juros, o mercado precificou o dólar um pouco mais para baixo. O fluxo parece que continua positivo e deve permanecer assim por conta da taxa de juros elevada”, afirma Mori, planejador financeiro pela Planejar.
O economista-chefe da JF Trust, Eduardo Velho, observa que a queda do dólar, induzida pela perspectiva de taxa Selic mais alta, poderia ter sido maior não fosse a o ambiente adverso para commodities e a alta da moeda americana.
Na fala de Campos Neto, Velho destaca o reconhecimento de que a inflação ficou acima do esperado e que os núcleos estão elevados. O economista estima que, com uma taxa Selic de 13,5% no fim do ciclo de aperto, o IPCA ainda superaria 8% neste ano. “O aperto monetário deveria levar a Selic para mais de 13,75% este ano para reduzir esse risco inflacionário”, afirma.
Lá fora, as expectativas estão voltadas a divulgação, amanhã, do CPI de março, que deve ratificar o quadro de inflação elevada nos EUA. Em evento, o presidente do Fed de Chicago, Charles Evans, defendeu hoje uma elevação da taxa básica em 50 pontos-base em maio. Sem direito a voto nas decisões de política monetária neste ano, Evans afirmou que seria interessante chegar à faixa de juros entre 2,25% e 2,50% no fim deste ano.
Bolsa fecha em queda
Embora em movimento mais discreto do que o visto lá fora nesta segunda-feira, 11, mas acentuado ao fim do dia com a piora em Nova York, o Ibovespa se alinhou à aversão a risco que prevaleceu desde a sessão asiática (Hong Kong -3,03%) e se estendeu à de NY (Dow Jones -1,19%, S&P 500 -1,69%, Nasdaq -2,18%), após dados de inflação ao consumidor e ao produtor na China além do esperado para março, leitura que reforça as preocupações globais quanto à escalada de preços. Nos EUA, os juros longos seguiram em alta, para vencimentos de 10 e 30 anos, enquanto os de 2 anos cederam.
Na B3, o Ibovespa fechou a sessão na mínima do dia, em baixa de 1,16%, a 116.952,85 pontos, saindo de máxima a 118.320,39 pontos, da abertura, com giro ainda moderado, a R$ 25,9 bilhões no encerramento. No mês, o índice cede 2,54%, mas acumulando ganho de 11,57% no ano.
Hoje, o índice DXY – que contrapõe o dólar a uma cesta de moedas de referência, como euro, iene e libra – aproximou-se e tocou a marca de 100, tendo a moeda americana sido negociada, no Brasil, perto da estabilidade ao longo da tarde, com baixa de 0,39%, a R$ 4,6904 no fechamento desta segunda-feira. A correção foi forte no petróleo, em queda superior a 4% para Brent e WTI na sessão, ambas negociadas abaixo de US$ 100 por barril – respectivamente, nas casas de US$ 98 e de US$ 94.
“O Brent veio hoje a US$ 98,2 na mínima, US$ 97,57, tendo sido negociado nos últimos três dias entre US$ 100 e US$ 103 por barril. Nossa gasolina pode ficar um pouco mais barata, há essa esperança, dado que o câmbio também tem se depreciado, na região de R$ 4,73 (por dólar). Se continuar essa tendência, Petrobras pode anunciar alguma redução, como a da semana passada, do GLP. Ainda que a defasagem de nossa gasolina esteja se equiparando a níveis internacionais, se (o barril) ceder a US$ 95, Petrobras pode anunciar algum ajuste no preço da gasolina”, diz Rodrigo Moliterno, head de renda variável da Veedha Investimentos.
Nesta segunda-feira, as ações de Petrobras fecharam no negativo (ON -1,32%, PN -0,76%), enquanto Vale ON cedeu 1,21%, em sessão também negativa para o setor de siderurgia, com queda de 4,56%, a US$ 136,35 por tonelada, para o minério de ferro na bolsa de Dalian, na China, reporta em nota a Nova Futura Investimentos.
No país asiático, o índice de preços ao produtor teve alta de 8,3% e o do consumidor, de 1,5% em março, e “o número elevado de infectados pelo coronavírus, aliado às restrições impostas pelo governo, gera receios quanto ao crescimento econômico da principal economia da região”, acrescenta a gestora.
Na B3, os grandes bancos tiveram desempenho misto no fechamento, com destaque, num lado, para BB ON (+0,63%) e Bradesco ON (+0,17%), e, no outro, para Itaú PN (-0,38%) e Santander (Unit -0,59%). Na ponta do Ibovespa, Braskem (+1,88%), à frente de Ambev (+1,81%), Cielo (+1,46%) e Carrefour Brasil (+1,12%). No lado oposto, BRF (-7,11%), Cogna (-5,65%), WEG (-4,66%) e B3 (-4,62%).
“Depois de uma semana de bastante cautela e de ‘gangorra’ nos mercados internacional e doméstico, começamos esta, mais curta (pelo feriado da Sexta-Feira Santa), falando novamente de inflação, que segue como principal destaque no Brasil e no mundo”, aponta Rachel de Sá, chefe de economia da Rico Investimentos. Para controlar inflação “rodando em 8% ao ano”, e diante de um mercado de trabalho “bastante apertado”, com pressão de alta nos salários, as sinalizações do Federal Reserve continuarão “impactando os mercados nos próximos meses”, acrescenta a economista.
O Ibovespa, depois do início da correção no dia 5, “ainda não mostrou definição muito clara de força, nem para retomada da tendência de alta (com resistência a 121 mil pontos), nem de correção mais profunda (com suporte a 115 mil pontos)”, observa Pam Semezzato, para quem “um ‘candle’ que mostre rompimento da máxima ou mínima do dia 6 de abril pode nos trazer um sinal melhor”.
Correio do Povo