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quinta-feira 18 abril 2024
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Era um Padre que Amava a Itália – Cel Claudio Vogt

Era um Padre que Amava a Itália
 
………Luigi Giovanni Vigna nasceu em 10 de outubro de 1923, no Norte da Itália. Ali fez os estudos iniciais. Em 1934, ingressou no Seminário dos Padres Carlistas. Rezou a Primeira Missa em 1947, aos 24 anos de idade.
………Ao silenciarem os canhões da 2ª Guerra Mundial, os ponteiros do relógio cobravam decisões… Onde ensinar o Evangelho? Decidiu labutar na América, ensinar no Brasil. “Andare via lontano…” Inicialmente, exerceu o apostolado em Nova Bréscia, Dois Lageados e Guaporé, assistindo aos imigrantes italianos…
………Os anos 50 trouxeram grandes mudanças. O Bispo o designou, em 1950, para o cargo de Vigário da Paróquia de Rondinha-RS. Naquela Terra religiosa e laboriosa, durante quatro anos, foi feliz, fez amigos e criou vínculos. Líder leal, voltaria mais tarde, em 1966, para criar o Ginásio São Carlos. Na Europa, o livro mais lido falava da fé: “Por quem os sinos dobram?”… Grato, ele voltaria tantas vezes quantas fossem necessárias… para agradecer.
………Quando se apagaram as luzes de quase um lustro de realizações, iniciou o ano de 1955, exercendo, com entusiasmo, a função de Professor do Ginásio Sarandi. Nascido para educar, dentre uma equipe de docentes ótimos, ele era o melhor!
………Por mérito, assumiu, em março de 1958, com apenas 35 anos de idade, o cargo de Diretor do Ginásio Sarandi, da Escola Normal Regina Pacis, da Escola São Roque e do Colégio Comercial Monsenhor Scalabrini. Sentiu o peso da responsabilidade: “a Economia dá a última palavra!” A Seleção Canarinho, marcada pelo “Jeca Tatu”, tinha pela frente a Copa do Mundo da Suécia… As coisas começaram a dar certo, quando o comando da delegação foi entregue a um empresário devoto de Nossa Senhora! O mundo conheceu, então, Pelé, Garrincha…
………Mas era preciso ir em frente, entrar no futuro… Os Padres Católicos se posicionavam, com clareza e coragem. Em 1960, um deles subiu no parlatório e criticou os gastos enormes para a construção de Brasília! Em 1962, um sacerdote fez um dos mais brilhantes sermões que a Cidade já viu, por ocasião da morte de uma atriz de cinema… “Ela tinha tudo! Só não tinha DEUS!”
………O Padre Luiz era versátil. Sabia rezar Missa em Latim, Italiano e Português. Em 1962, quando eu era Aluno da Irmã Anita, na Escola Normal Rural Santa Gema Galgani, ele criou o Ginásio Industrial São José. O clima era de euforia: a Seleção Brasileira voltou vitoriosa do Chile…
………Em 1965, o dedicado Padre foi meu Professor de Geografia, Inglês, Diretor e Tesoureiro… Era entusiasmado, seguro e coerente. Elogiava os Americanos por trabalharem muito… e, à noite, irem ao Cinema. Após o jantar, quando havia filme bom no Cine Guarany, os Padres embarcavam numa Kombi e iam “crescer em cultura”… A música italiana vivia dias de glória! Os artistas cantavam canções que vinham do fundo do coração… (“Al di la”… “Muito além das estrelas… está você…”).
………Ainda em 1965, obteve recursos do Programa Aliança para o Progresso e instalou a Gráfica Guarany Ltda. Com a auto-estima elevada, conseguiu recursos vultosos com uma Nação Amiga. Construiu o Ginásio Industrial São José, para meninos e meninas. Eu e meus colegas de aula estávamos presentes na solenidade de inauguração. Diante das autoridades regionais, o Padre Líder elogiou a Alemanha: “…foi destruída pela Guerra. Em poucos anos, com união e trabalho, se reconstruiu e, agora, ajuda o Brasil!”
………Ele era um Padre de bom coração. Fazia caridade. Pensava nos pobres… Foi ele quem fundou o Patronato, em 1966! Em nossa Pátria verde e amarela, o Futebol reflete no humor do Povo… Eu reprovei em Álgebra. Fiquei traumatizado! Chorei junto com a “pátria de chuteiras”: sem o Garrincha, a Seleção fracassou na Inglaterra!
………Do “Império Romano”, o bom menino trouxe valores morais. Humilde, percorria as salas de aula para cobrar as mensalidades… Nós, alunos, esquecidos ou ingratos, quase nunca tínhamos dinheiro. Será que sabíamos a importância da Educação? Hoje, até entendo o valor do “x”. Mas tenho dificuldade para entender: por que fecharam o Colégio Santa Gema? Por que sacrificaram os eucaliptos?
………Trabalhador, era normal o encontrar suado. Vitórias lhe deram autoconfiança. Dedicado, ele mesmo consertou a antena da Rádio. Sincero, quando olhava por cima dos óculos pretos, o Estudante sabia que ouviria algumas verdades. Era defendido por docentes e discentes. Estudou a Lei. Escreveu o Regimento da Escola Normal Regina Pacis. Empreendedor nato, era um compósito de vontade, fé e orgulho. Trouxe da Itália uma pedra angular: o valor da Educação. Dentre caminhos e descaminhos, escolheu ensinar. Edificou ambiente sadio, juvenil, agradável…
………Quando entrei, pela primeira vez, na Sala do Diretor, tive uma surpresa: esperava encontrar luxo e privilégio, num local amplo e confortável. Encontrei o retrato da Simplicidade. Mas não era isso que ele ensinava? Alguns cidadãos faziam de tudo para serem vistos nas luzes da ribalta. O Diretor do Ginásio trabalhava nos bastidores. Tinha visão de futuro. Integrou a Pia Sociedade dos Padres Carlistas, mantenedora de Escolas.
………Por algum motivo, os caminhos se cruzavam. Em 65, após a grande nevasca, no Dia da Pátria, o Padre me viu “batendo um pé meio muito”. Em 66, olhou-me sobre os óculos, vencido pela Matemática. Em 67, por criticar o Ginásio, falou com meu Pai. Em 68, diante de aula monótona, indisposto, apaixonado, pedi para ir embora… Ele quis chamar o Médico. Quando a crise chegou, busquei bolsas de estudo no Palácio Farroupilha, sem falar com o Diretor. Na hora do jantar, o Pai me ensinou: “Mais vale acender uma vela… do que maldizer a escuridão!”
………Quando 1970 chegou, trouxe lágrimas junto… Fiquei emocionado ao ver os formandos de 69 lutando pela vida. A Turma se espalhou pelo Brasil… Poucos tiveram condições de enfrentar o “Porto”. O Ari, filho do Alemão Albano, não conseguia emprego, nem Colégio. Os Comerciantes, amigos do meu Pai, não me davam trabalho. O Deputado Ivo Sprandel conseguiu uma vaga, num Colégio Público, à noite…
………Em março, o dinheiro acabou. “Senza soldi!” Quando eu estava escrevendo uma carta para casa, no balcão do Hotel dos Sarandienses, um conterrâneo contou-nos: “O Padre Luiz está baixado no Hospital Beneficência Portuguesa!”
………Eu e o Colega de Aula Ari Withauper, sem perda tempo, subimos morro acima. “Um bom menino precisa saber agradecer, dividir, perdoar…” Ficamos trancados na portaria. Eu disse que era filho do Fridolino. O Padre Luiz estava sozinho! Num quarto de frente do 2º andar, amplo, silente… Estava lúcido, não sentia dor. Não falou nada sobre a doença. Lembrava-se de cada um dos estudantes. Gostou muito da nossa visita, mas estava desanimado… (“Giorni senza domani”). Estava partindo para uma grande batalha. A oração era a arma. O Grande Diretor ainda tinha o terço.
………Quando junho chegou, a Copa do Mundo no México tinha  sabor amargo. Os exames confirmaram cruel patologia. A medicina dava passos lentos. Naquele inverno, o Minuano assobiava, assustava… até que, no dia 22 de agosto, levou o Grande Padre Luiz, meu querido Diretor, aos 46 anos de idade!
       Alguns homens vivem.
       Outros passam pela vida.
       Alguns caminham para Deus.
       Alguns homens morrem.
       Outros viram lenda.
       Alguns entram no Paraíso…
………LUIGI GIOVANNI VIGNA era um Padre que amava a Itália, mas que, de tanto sentir orgulho dos Alunos que educou, descobriu que amava o Brasil…
P S: Hoje, a Escola Sarandi é orgulho municipal, patrimônio da Educação. Brilha entre as melhores do Brasil!

 




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