Segundo dia de julgamento se encerrou após às 22h e trabalhos seguem nos próximos dias
O segundo dia do tribunal do júri do caso da Boate Kiss foi marcado pela emoção e a exaustão dos sobreviventes em relembrar memórias traumáticas do passado ao longo de toda a sexta-feira.
Na sessão, que se encerrou após às 22h, os jurados ouviram os depoimentos das vítimas – Emanuel Almeida Pastl, Jéssica Montardo Rosado e Lucas Cauduro Peranzoni – e também o relato do engenheiro, Miguel Ângelo Teixeira Pedroso, a primeira testemunha de acusação a depor no processo.
“Não tinha alarme de incêndio, nem sinalização e iluminação. Não senti em mim água caindo de chuveiros de teto durante o incêndio”, relatou. Na sequência, o segundo depoimento, que veio carregado de emoção.
Ela chorou em vários momentos. “
Eu me apavorei.
Era muita gente caindo em cima dos outros”, recorda. Jéssica teve de ser amparada e retirada do júri para receber atendimento médico depois de ver as imagens do incêndio mostradas pelos promotores da acusação. “Estou muito mal”, balbuciava, chorando. Após ser atendida, ela voltou ao júri.
O dia também teve outro momento marcante. Durante uma pausa, uma mãe chorava no corredor do Foro Central.
“Dá raiva ficar perto desses assassinos e não poder fazer nada.
Hoje tá muito pior esse julgamento. Eu não estava preparada para ver aquelas imagens”, desabafou Nelci Almeida Konzen, que perdeu a filha Jéssica Konzen, de 21 anos, no incêndio.
Responsável pelo projeto do isolamento acústico da casa noturna, Miguel Ângelo Teixeira Pedroso garantiu que em nenhum momento sugeriu ou recomendou o uso de espuma no local.
“Eu fiz o tratamento acústico com alvenaria e gesso acartonado com espuma acústica.
Eu não digo que ela (espuma acústica) não vá ser atingida pelo fogo, mas é mais segura. Ela não vai entrar em combustão imediatamente”, explicou.
No dia da tragédia, Pedroso estava em Recife, na casa de uma irmã. Ele soube através da esposa, que assistiu na televisão sobre o incêndio, que o advogado de Elissandro Spohr estaria citando o engenheiro como responsável pela colocação de espumas no local. “Falei com o delegado na época e pedi para prestar depoimento, pois queria esclarecer os fatos”, disse o coronel.
O último a depor foi Lucas Cauduro. Questionado pelo juiz Orlando Faccini sobre o seu estado psicológico após a tragédia, ele suspirou e não conseguiu falar.
O magistrado então disse: “Não precisa responder. O silêncio também fala”. Ele também falou sobre o instante em que percebeu o incêndio. “Não é uma explosão. Fez um outro barulho. Quando vi aquela nuvem preta muito densa, olhei para o outro DJ e disse: vamos sair daqui”, afirmou.
Momentos tensos entre juiz e advogado de defesa
A primeira discussão entre ambos se deu durante o depoimento de Jéssica Rosado. Em determinado momento, a advogado aproximou dela seu cliente, Elissandro Spohr, um dos antigos donos da Kiss, e perguntou se a testemunha o odiava.
Ela respondeu que não, mas o diálogo foi interrompido pelo juiz, que afirmou que julgava a ação “apelativa”. Marques rebateu afirmando que discordava e que o juiz estava realizando “cerceamento de defesa”.
O juiz voltaria a promover uma nova discussão com Jader Marques no início da noite. Na ocasião, Neto comentava sobre a possibilidade da realização de uma pausa de 40 minutos para o jantar e ouviu do defensor que esse intervalo era apenas o tempo necessário para o deslocamento até um shopping onde ele e sua equipe fariam a alimentação.
O magistrado rebateu afirmando que o julgamento precisa ter continuidade. “A minha janta tá num ‘tupperware’ gelada e eu vou comer ela ali na sala. Então faça a sua comida e traga de casa, ou então vá comer e depois a pessoa volta”, disse, propondo alternância entre o advogado e seus assistentes. “Posso lher a minha comida se o senhor quiser”, afirmou, arrancando aplausos da plateia formada majoritariamente por parentes de vítimas da tragédia.
Correio do Povo