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‘Querem me prender? Me prendam, eu não aguento mais’, chora Elissandro Spohr

Ex-sócio da boate é o primeiro dos quatro réus a ser interrogado no julgamento

Leonardo Catto
Foto: Pedro Piegas (Diário)

O primeiro réu a depor no júri do Caso Kiss foi Elissandro Spohr, ex-sócio da boate.

Nesta fase, os réus não são obrigados a responder e têm direito ao silêncio. Ele iniciou o interrogatório às 18h07min.

Em determinado momento do interrogatório do juiz Orlando Faccini Neto, Elissandro declarou, aos prantos: “Querem me prender? Me prendam, eu não aguento mais”. O interrogatório teve duas horas e 29 minutos, desconsiderando o intervalo.

RELAÇÃO COM O PAI
Em referência ao que Nathalia Daronch, esposa de Elissandro, que foi ouvida na fase de oitivas, disse em depoimento, o juiz perguntou sobre a relação do réu com o pai. O ex-sócio da Kiss contou que conheceu o pai aos 12 anos e que mantém contato, mas distante.

 Meu pai tem a família dele, e eu tive a minha com minha mãe. Claro que a gente não é inimigo. Eventualmente, a gente se encontra – disse

Elissandro mencionou que o pai não é dono exclusivo de uma rede de lojas de pneus, como foi dito em outros momentos.

Ele afirmou ainda que “não conhece” o poder aquisitivo do pai. Atualmente, o réu disse que trabalha como comerciante.

 

Em entrevistas anteriores, ele afirmou que trabalhava em um negócio da família relacionado a pneus.

MÚSICA
Depois, ele relatou como iniciou na música e o surgimento da Projeto Pantana, banda que liderava. Elissandro lembrou que, inicialmente, o contato com a noite era por apresentações próprias ou indicações de bandas.

– Sempre tive o espírito empreendedor e comecei a levar a banda a sério. Achei que a gente poderia ser a próxima banda de rock gaúcho – lembrou.

Ainda antes de contar sobre a relação com música, Elissandro relacionou o gosto pela arte com ter a boate:

– Eu tocava, era músico. No meio do caminho, vim a ser proprietário da boate Kiss.

Elissandro mencionou o Absinto como “a boate do Mauro”. Ele disse que o responsável pela organização de shows lá recusou o show da Projeto Pantana, então, ele mesmo iria tentar vender a apresentação em outros locais.

– Montei um pacote de venda de shows. Comecei a tocar em Passo Fundo, Porto Alegre… – contou sobre convidar artistas já conhecidos.

COMEÇO NA KISS
Elissandro relatou ter ido na inauguração da Kiss. Ele pediu a Tiago Mutti e Alexandre Marques para tocar na casa. Recebeu, de volta, um convite para cuidar da agenda da Kiss. A boate não teve retorno positivo, segundo o relato, e Elissandro afirmou que seguia apoiando com a organização das bandas, mas se afastou.

– Passou um tempo, o Mutti me ofereceu a boate. Ele ofereceu para um monte de gente – falou sobre a negociação de compra da Kiss.

Quando comprou parte da boate, Elissandro disse ter tido atritos com Alexandre na administração. Ele comprou a parte do sócio. Foi quando ocorreu a obra do pub da Kiss. Ele contou que, na mesma época, criou a festa que rendeu sucesso à Kiss. Neste momento, o réu se emocionou.

– Quando se fala de Kiss, só lembram a parte ruim. E quando o cara lembra da parte boa, também causa… porque também teve parte boa – disse no primeiro choro do depoimento.

REGULARIZAÇÃO
Elissandro disse que a Kiss estava em condições de funcionamento. Ele citou um episódio de vistoria.

– A Kiss foi tão vistoriada. Se fala dos dois bombeiros. Eu tinha 27 seguranças. A polícia foi lá uma vez, estava só o pub, com 60, 70 pessoas. Entraram para pedir a carteira dos seguranças, apresentaram. Aí se fala em treinamento… – disse.

BARULHO E ESPUMA
Quando questionado sobre as adequações devido à poluição sonora, Elissandro respondeu que apenas uma vizinha reclamava. Ele contou que propôs bancá-la em outro apartamento para “não ter incômodo a ela”.

Elissandro disse ter consultado Mutti sobre o isolamento, que, por sua vez, recomendou o contato com o engenheiro Samir Sâmara. Foi proposta a construção de uma parede e a colocação de espuma.

Conforme o réu, o barulho seguiu e Samara indicou outro engenheiro, Miguel Angel Pedroso, para o serviço. Elissandro disse que a espuma não foi colocada na boate graças a Pedroso. Foi então que o teto foi rebaixado, o palco mudou de lado e foi feito o isolamento com paredes de pedra a partir do projeto de Pedroso, mas que ele não executou. Elissandro relatou ter sido nesse momento que entrou em contato com Nivia da Silva Braido, arquiteta que também depôs no júri. Segundo o réu, a espuma foi retirada nesta obra.

O problema seguiu sem ser resolvido. O apartamento da vizinha foi reformado, bancado por Elissandro, para garantir o isolamento no local. Porém, como o palco foi trocado de lugar, outros vizinhos passaram a reclamar da situação.

– As espumas que foram tiradas, pedi para colocar no palco. Cheguei lá e achei horrível, tinha estragado tudo. Pedi para tirar de novo, pensei em colocar espuma nova. Liguei para o Samir, que disse que não tinha. Que tinha encomendado, mas ainda não tinha chegado. O plano era colocar todo o teto, mas só colocamos em cima e dos lados – contou.

Foto: Pedro Piegas (Diário)

GURIZADA FANDANGUEIRA
A banda, segundo Elissandro, já tinha tocado na Kiss antes do incêndio. Ele falou que não viu se já tinha sido usado artefatos pirotécnicos.

– Eu cheguei a vender a Gurizada Fandangueira. Eu nunca vendi como se fizessem, quem sabe eles faziam (efeitos pirotécnicos), a gente até discutiu isso quando foi preso – disse ao juiz.

Elissandro disse que não lembra de ter sido questionado sobre uso de pirotecnia na Kiss e, caso fosse consultado, não deixaria.

27 DE JANEIRO
O juiz questionou sobre a noite em que aconteceu o incêndio na boate. Elissandro relatou ter chegado por volta de 1h40min na Kiss. Na sequência, o depoimento seguiu com um relato dos eventos daquela madrugada.

Ele afirmou ter dado um “giro” pela boate, como era costume. Depois, relatou ter retirado um rapaz que estava embriagado da boate. Quando voltaria para a boate, Elissandro falou ter sido informado sobre o começo do fogo – ainda sem saber o que acontecia – e pediu para abrir as portas. Elissandro disse ter ficado mais calmo quando encontrou Nathalia e com a chegada dos bombeiros.

– Cheguei a pensar: “vai se resolver”. Mas não foi o que aconteceu – lembrou.

Elissandro relatou ter saído de lá por receio dele e de outras pessoas por possíveis retaliações. Ele pediu para ir até a delegacia, onde informou sobre o incêndio. Depois, foi orientado a ir para casa. Neste momento, aos prantos, ele relatou ter telefonado para o pai para pedir ajuda.

– Querem me prender? Me prendam, eu não aguento mais. Eu não quis isso – gritou, antes de se virar para a plateia e repetir que não teve intenção.

Elissandro foi interrompido pelo juiz, que definiu intervalo para o jantar. Enquanto isso, sobreviventes e pais deram as mãos e se abraçaram, antes de deixar o plenário.

RELAÇÃO COM OS PAIS
Depois do retorno, o juiz perguntou se Elissandro teve alguma manifestação direta aos pais das vítimas. Orlando Faccini Neto sugeriu que isso tivesse sido feito. Elissandro falou sobre tentativas de contato com pais, mas que não tiveram sucesso.

LOTAÇÃO
O juiz citou uma petição de 30 de janeiro de 2013, em que era informado que o limite de público da Kiss era de 600 pessoas. Elissandro explicou que ocorria um “giro” de público e que mais pessoas só poderiam entrar conforme houvesse saídas.

– Não teria como ter mais que 800 pessoas – disse sobre a lotação.

EXTINTORES
Segundo Elissandro, os extintores foram recarregados de dois a três meses antes do incêndio. Ele assumiu que alguns extintores estavam fora do lugar, mas garantiu que não houve brincadeiras com os equipamentos, como foi dito em outros depoimentos.

– Por que o extintor não funcionou? Deus sabe! Eu queria que tivesse funcionado – desabafou.

PERGUNTAS
Por orientação do advogado Jader Marques, Elissandro não responderia perguntas das defesas ou da acusação. Os jurados puderam fazer mais perguntas, por intermédio do juiz, mas encerraram. O interrogatório terminou às 21h19min.

Fonte – diariosm.com.br