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Já pensou em prender alguém? – Por João Paulo Gelain Cichelero

                                                    Já pensou em prender alguém?

 Sim, você, cidadão comum, tem legitimidade para dar voz de prisão a outrem.

A Carta Magna brasileira de 1988, ao tratar dos direitos e garantias fundamentais do cidadão, determinou que, salvo em alguns casos na esfera militar, “ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente […]” (art. 5°, LXI). Neste diapasão, o Código de Processo Penal reproduziu o texto constitucional e complementou a regra, estipulando que a ordem da autoridade judiciária para prisão dar-se-á, somente, ao final do processo, em razão de sentença judicial transitada em julgado ou, no curso da investigação ou do processo, nos casos de prisão temporária ou preventiva (art. 283).

Das duas hipóteses, a que nos interessa neste artigo é a possiblidade de prisão em flagrante. Neste tocante, cumpre mencionar que há quatro situações admitidas de flagrante, segundo art. 302 do CPP, quais sejam: a) encontrar-se cometendo a infração penal; b) acabando de cometê-la; c) ser perseguido, logo após, em circunstância que permita presumir a autoria; d) ser encontrado, logo depois, com instrumentos do crime que permitam a presunção da autoria.

O mais interessante e o que alguns não têm conhecimento é o fato de a lei autorizar todo e qualquer cidadão a efetuar a prisão quando houver situação de flagrante. O art. 301 do Diploma supramencionado prescreve que “qualquer do povo poderá e as autoridades policiais e seus agentes deverão […]”, isto é, ao cidadão comum tem-se uma faculdade no agir, enquanto às autoridades existe o dever. Salienta-se que a permissão concedida estende-se a todas as modalidades de flagrante, inclusive a de perseguição ao criminoso.

O ato da captura não é revestido de maiores formalidades, não havendo uma frase certa a ser pronunciada. Só o que a lei preceitua a respeito é que o preso deve ser informado de seus direitos constitucionais, dentre os quais, o de permanecer calado, além de ser lhe assegurada a assistência da família e de advogado. Dada voz de prisão, por conseguinte, o delinquente deve ser conduzido até à Delegacia de Policia, para apresentação à autoridade competente, que deverá analisar a legalidade do ato e, então, sendo o caso, lavrar o auto de prisão em flagrante.

Contudo, há de se admitir que, na prática, o dispositivo legal tem pouca aplicabilidade. Ora, são raras as situações de flagrante delito em que um cidadão comum, sem preparo técnico para agir, lograria êxito em realizar prisão de outrem. Aliás, na maioria dos casos, sequer recomenda-se qualquer esboço de reação por parte da vítima ou de terceiros, haja vista o risco de agravar a situação, principalmente, nos crimes cometidos com violência, grave ameaça, uso de arma de arma branca ou de fogo, etc.

Por fim, o juízo de oportunidade e conveniência para a realização do ato deve ser feito por cada indivíduo, considerando suas habilidades e condições de momento, sempre levando em conta as circunstâncias e peculiaridades de cada caso. Logo, deve-se evitar ações irrefletidas, que, por vezes, põem em risco um bem maior.

Por João Paulo Gelain Cichelero, Colaborador Emérito da Empresa Fornari Advogados Associados, Agente Penitenciário da SUSEPE-RS, Pós-Graduado em Direito Penal e Processual Penal.

Sarandi-RS, 21 de novembro de 2019.