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Em um motel, lutador desidrata e entra em agonia antes de sua grande luta

O lutador profissional de MMA Acácio “Pequeno” dos Santos, 1,94m de altura, esparrama-se no banco de trás de um gol preto empoeirado. O carro corta a noite de Guarulhos, região metropolitana de São Paulo.

Do lado oposto ao de Acácio, o treinador Magno Wilson tenta amenizar a tensão. Espremendo-se entre os dois, Mohamed Said, um peso-mosca com um cavanhaque no queixo, apenas balança a cabeça. Até isso é difícil.

Quem dirige o carro é Johnny, que subiu no octógono pela primeira vez depois que o irmão mais velho se suicidou. Eu estou no banco do carona, prestes a entrar em um quarto de motel com quatro caras que eu nunca vi na vida.

A atendente lança um olhar curioso e hesita ao nos dar boas-vindas. O gol entra silencioso e discreto no motel cuja propaganda anuncia: “Suítes totalmente equipadas para seu maior prazer a partir de R$ 74 a pernoite.”

Como fazer seu corpo secar em uma noite

No banco de trás, Acácio parece definhar aos poucos. É meia-noite de uma quarta-feira fria, e às 10 horas da manhã seguinte ele precisará estar pesando exatamente 84,3kg ou não conseguirá subir no octógono para a luta mais importante de sua vida.

Há 20 dias ele pesava 104kg. Cortou doces, refrigerantes e o jantar. Iniciou uma dieta radical de apenas 400kcal diárias (única refeição do dia: quatro ovos cozidos sem gema, quatro cabeças de brócolis, duas rodelas de pepino e alface à vontade). Trabalhava 16 horas em dois empregos e treinava por outras duas horas no fim da noite.

Perdeu 16kg, a voz e a alegria de viver.

Adriano Wilkson/UOL

Ao meio-dia da véspera da pesagem, comeu pela última vez. Às 15h, bebeu água pela última vez. Às 22h, correu por uma hora embrulhado em plástico de congelar legumes, em um moletom e uma capa de chuva. Evaporou pouco mais de um quilo.

Às 23h30 tomou um diurético para urinar mais. Meia hora depois entrou na suíte do motel para a pior fase de todo o processo: a desidratação radical. Acácio precisava perder 2,7kg nas próximas cinco horas. Com a aparência de quem acabou de ser atropelado por um caminhão, ele mal conseguia caminhar sozinho.

Suar (muito) é o primeiro desafio de um lutador de MMA

Johnny aumentou a temperatura do ar-condicionado para 28ºC. Magno virou a torneira da banheira. Um jato de água quente começou a fluir. Acácio tirou a roupa e, só de cueca, foi colocado na água para suar.

Adriano Wilkson/UOL

As paredes e o teto começaram a suar, mas Acácio não. “Demora um pouco, mas quando começa é de uma vez só”, tranquilizou-se o treinador.

Sessenta por cento do corpo de um homem adulto é feito de água. A água é o meio no qual ocorrem as reações químicas fundamentais para o bom funcionamento do organismo. Sem água, todos os órgãos sofrem. Enquanto seca, o corpo de Acácio dá sinais de que está sob ataque de uma entidade invisível.

Você não pode perguntar o que ele está sentindo porque ele é incapaz de articular uma resposta ou verbalizá-la nesse momento. Seus olhos estão embaçados e distantes. Suas pálpebras se movem com extrema dificuldade.

Sua pele está enrugada e as articulações, travadas. Ele caminha como se tivesse 80 anos de idade. Seu corpo musculoso vai aos poucos assumindo um aspecto cadavérico.

Adriano Wilkson/UOL

O relógio marca o tempo, e o tempo marca o corpo do lutador

À 1h05 Acácio tenta falar alguma coisa, mas de sua boca não sai nenhuma voz.

À 1h14 seu peito começa a expandir e contrair num ritmo frenético, mesmo ele tendo estado o tempo todo apenas deitado na banheira, com o corpo parcialmente submerso, suando.

À 1h30, precisa da ajuda de dois homens para levantar da banheira.

À 1h44 já é quase impossível manter os olhos abertos por muito tempo.

À 1h55 tenta fazer xixi. Já quase não há mais água em seu corpo e a que sobrou parece querer sair somente pelos poros da pele.

Às 2h02 Acácio Pequeno tira a cueca, se seca, espera o corpo esfriar e sobe na balança pelado, banhado na esperança de ter batido os 84,3kg.

Adriano Wilkson/UOL

O ponteiro corre e para: 85kg.

“Essa porcaria deve estar quebrada”, palpita o treinador Magno Wilson. “Vamos ter que ir ao Extra.”

No meio da madrugada, eles caminham como pálidos zumbis

Os dois lutadores caminham até a balança eletrônica do supermercado como zumbis perdidos no meio da madrugada. Mohamed está tranquilo porque tem quase certeza de que conseguiu. Ele se pesa primeiro e percebe que já cumpriu sua meta: 58kg. Não festeja, não sorri, não parece ter força para nada.

Acácio tira a blusa e sobe depois. A balança mostra 85,55kg. Ele levanta o dedo indicador para me dizer que ainda precisa perder um quilo.

Adriano Wilkson/UOL

De volta ao motel, deita-se na banheira quente enquanto Johnny e Magno começam a procurar gotículas de suor em sua testa. “Está começando a suar”, anima-se Johnny. “É só uma suadinha”, diz o treinador, cansado. “A água tá fria demais.”

Eles pedem à gerência do motel para aumentar a temperatura da água, mas a gerência do motel parece ter problemas maiores. “Vamos ter que colocar o negão no carro”, diz Magno. E se dirige a Acácio, que parece distante, olhando sem ver: “O que você acha, filho?”

Mas Acácio não tem nenhuma condição de raciocinar agora.

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O carro

“A desidratação é a pior parte do processo, mas o carro é a pior parte da desidratação”, me explica Johnny, que já tinha passado por isso antes. “Teve uma vez que eu chorei ali dentro.”

O carro é usado apenas como último recurso, quando todos os outros falham. Acácio é colocado no banco do motorista. No do carona senta-se Magno. Eles fecham a porta e ligam o veículo. Acionam o ventilador para jogar ar quente pra dentro. O carro rapidamente vira uma estufa. O vidro embaça. Você quase consegue enxergar o ar pesado entrando pelas narinas como labaredas e queimando traqueia, peito, pulmões… É desesperador.

Johnny e eu ficamos do lado de fora. Ele cronometra três minutos, nos quais Acácio ficará lá dentro tentando suar.

Lá dentro, Acácio agoniza.

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A agonia do lutador não tem hora para acabar

De fora, você tem a impressão de que ele vai apagar a qualquer momento. “Ele tá no limite extremo”, adverte Johnny. Ao lado, o treinador dispara palavras de encorajamento: “Falta pouco, filho!”, “Aguenta, vamos!”

A cada três minutos, Acácio abre a porta e respira um pouco do ar de fora, um alívio momentâneo. Mas precisa fechar de novo alguns segundos depois e, então, recomeçar a sofrer. Os três últimos minutos são os piores.

“1… 2… 3… 4…”, começa Magno Wilson. É a contagem progressiva para o fim do último tiro no carro-estufa.

Acácio limpa o suor do rosto. Tenta puxar o oxigênio, mas o oxigênio não entra em seus pulmões. Suas mãos procuram algum objeto perdido no ar que ele não sabe o que é.

“14… 15… 16…”

Ameaça abrir a porta do carro, mas desiste no último momento. Seu peito se movimenta como se o coração ali contido estivesse prestes a explodir. Seu rosto se contorce em dor, em fadiga intensa.

“17… 18…”

“E se acontecer alguma coisa agora?”, me pergunto.

“19… 20.”

Acácio abre a porta de supetão. Põe a cabeça para fora como se fosse vomitar. Inspira todo o ar do mundo como se estivesse acabado de voltar das profundezas do oceano. “Calma, devagar”, recomenda o treinador.

Adriano Wilkson/UOL

Ele é levantado devagar e se joga na banheira quente para mais alguns minutos de suadeira. Depois se seca novamente e vai para a última pesagem. São quase cinco horas da manhã e estamos todos exaustos. Em algum lugar da cidade os galos cantam. Ali dentro só se escuta as batidas do coração de Acácio. O lutador precisachegar aos 84,3kg.

Pelado, sobe na balança e olha para um ponto entre os pés:

85kg.

“Essa balança tá doida”, diz Magno Wilson.

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A última esperança

“Vamos tentar a balança da academia.” Fomos. Enquanto os passageiros tentam cochilar no carro, moradores de Guarulhos esperam a condução para o trabalho. Ao chegar à academia, os lutadores se agasalham para vencer a distância da calçada até lá.

Acácio caminha sem expressão definível até a balança analógica, muito mais precisa do que a outra comprada na farmácia. Ele tira a roupa pela última vez na noite e sobe. Magno opera a máquina medindo as duas réguas de metal que balançam como um pêndulo, torcendo por um milagre da tecnologia…

“Puta que pariu, viu”, ele diz, e faz um sinal da cruz. “Graça a Deus!”

A balança marca 84,2kg. Acácio está dentro. Por cem gramas. Dali a sete horas, depois da pesagem oficial, ele começará uma dieta de engorda na qual ganhará quase 15kg em um dia. A ideia é que, mais pesado, ele tenha alguma vantagem sobre seu oponente, um rapaz menor que não passará por um processo tão radical quanto o dele.

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É assim que as coisas funcionam no MMA. No dia seguinte o lutador entrará no octógono do Thunder Fight, considerado um dos maiores eventos de MMA profissional de São Paulo. Apesar de atuar como segurança privado em duas empresas, Acácio sonha em ter uma carreira de lutador.

Filho de família pobre, deixou a cidade de Ponto dos Volantes, 11 mil habitantes no nordeste de Minas Gerais, para se aventurar na capital paulista. Sua maior aspiração é um dia chegar ao UFC, o maior evento do esporte. Seu cartel é de 11 lutas e oito vitórias (seis delas por nocaute). Mas as três derrotas o deixam em uma situação delicada na carreira porque o UFC não costuma contratar lutadores com um número muito alto delas.

Uma quarta derrota significaria praticamente o fim do sonho do UFC. Um pequeno detalhe faz a próxima luta de Acácio ser ainda mais dramática. Seu adversário é Quemuel Ottoni, um lutador perigoso, filho de uma família tradicional no MMA.

Ottoni fez dez lutas desde que subiu no octógono pela primeira vez.

Ele nunca perdeu.

O grande dragão de komodo é filho de uma pequena dinastia

Naquela rua havia uma agência de banco que fechou sem aviso há alguns meses. No lugar dos caixas eletrônicos, foram instalados sacos de boxe e um piso de borracha. Um cronômetro na parede avisa quando chega aos cinco minutos, o tempo de assalto de uma luta profissional de MMA.

Onde antes havia filas de gente impaciente há hoje um octógono: um gradil negro de oito lados feito para separar a fúria dos lutadores do público em geral. Onde antes havia um bancário, há hoje Quemuel Ottoni, 23 anos, a pele na cor de café-com-leite, um bigodinho por fazer e as palavras JESUS CRISTO tatuadas no antebraço. Em hebraico.

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Ele sibila a cada soco, a cada chute, a cada cotovelada que desfere sobre um homem careca, que aperta os olhos para receber as investidas do lutador de 91kg, no auge de seu vigor físico.

É só um treino, mas de repente o homem cai com as costas no chão. Quemuel projeta o corpo à frente, iniciando um espancamento de cima para baixo, o que na língua do MMA se conhece como ground and pound. Chão e porrada.

O homem careca não pode fazer nada além de se defender. Ainda bem que está vestindo umas luvas aparadoras, feitas com uma borracha que absorve o impacto dos golpes. A sequência de socos acaba. O homem careca se levanta e cumprimenta Quemuel, que está a três dias de subir no octógono para bater em alguém para valer.

Uma família feita de suor e luta

Quemuel nunca perdeu uma luta sequer e não acredita que vai ser agora.

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“Eu respeito muito o Acácio”, diz o lutador sobre seu oponente de sexta à noite, “mas quando a gente subir ali é a mãe dele ou a minha que vai ficar chorando depois.”

Para Quemuel Ottoni, o MMA é um esporte de família, até porque o homem careca que acaba de lhe servir de sparring é Gilberto Ottoni, seu pai e também seu mestre. Gilberto, campeão de ao menos oito artes marciais diferentes, resolveu um belo dia criar o próprio estilo. Inspirado na filosofia kung-fu e em filmes de David Carradine, inventou técnicas e golpes e usou os filhos como cobaias da fundação do komodô (caminho do guardião, em japonês), a arte marcial da família.

O mascote da academia é um imenso dragão de komodo.

“Ele via fitas VHS de lutas, pensava em um golpe novo e acordava a gente no meio da noite para experimentar”, diz Israel Ottoni, o irmão mais velho, também lutador. “A gente acordava às quatro da manhã, treinava e ia para a escola às seis.”

Adriano Wilkson/UOL

Na escola, os irmãos se envolviam em brigas nas quais descobriram que a força e a violência poderiam ser um meio para sobressair entre os demais. Em casa, aprenderam a canalizar toda aquela agressividade para o esporte. Na família Ottoni, os três filhos e as duas filhas seguiram os passos do pai e em algum momento da vida subiram em ringues, tatames e octógonos para lutar.

Eles todos moram na mesma casa – 14 pessoas, contando com filhos, cônjuges e agregados, que vivem, conversam e respiram MMA 24 horas por dia. “Eu luto porque quero dar uma vida melhor para as minhas filhas”, me disse Quemuel, que já participou do Jungle Fight, evento considerado o mais importante da América Latina. “Mas não quero que elas sejam lutadoras.”

Quemuel transpira confiança quando fala de seu próximo desafio.

“Eu só sei de uma coisa”, disse ele no dia em que nos conhecemos. “Essa luta não vai ter os três rounds. Eu vou acabar com ela antes.”

O lutador que corta o cabelo antes de subir ao octógono

Adriano Wilkson/UOL

Na véspera do grande dia, Quemuel foi acordado por um amigo às três da manhã para se alimentar. Passada a pesagem precisava engordar novamente para a luta. Comeu um pacote de macarrão instantâneo sabor galinha caipira e voltou a dormir. Às 7h30 acordou outra vez e comeu mais um miojo.

No meio da manhã tomou café e foi se exercitar. Depois cumpriu um ritual que se repete antes de qualquer luta: foi ao cabelereiro passar máquina 1 na cabeça. Almoçou (mais macarrão, arroz e peito de frango), se despediu das duas filhas com um beijo e reuniu a família para uma última oração antes de pegar o carro rumo à zona leste de São Paulo.

Ele não gosta de ser incomodado nos minutos que precedem a entrada no octógono. Engata um fone nos ouvidos, fecha os olhos e começa a dar soquinhos no ar como se estivesse acertando em um inimigo imaginário. Alguma coisa invisível parece se soltar de seu corpo.

Incapaz de disfarçar a ansiedade caminha de um lado para o outro dando voltas em seu próprio eixo como um leão hiperativo preso no banheiro.

Ele finalmente escuta as caixas de som do ginásio anunciarem seu nome e uma fumaça de gelo seco toma o ar. Quemuel sobe ao octógono ao som de uma música épica que tenta traduzir a agressividade que ele quer transmitir como lutador. Com o olhar compenetrado, repassa mentalmente todas as formas com as quais pode finalizar Acácio Pequeno lá em cima.

Tiago Liasch/Thunder Fight

Depois dele, Acácio é anunciado. Ele sobe ao octógono tentando fazer cara de mau, mas como é um sujeito muito simpático, o resultado é um olhar que transmite uma atitude meio passiva, meio assustada.

Enquanto o gigante caminha em direção ao adversário mais perigoso que ele jamais enfrentara na carreira, o público canta a plenos pulmões a música que Acácio escolheu para sua entrada triunfal: “Chopis Centis”, dos Mamonas Assassinas.

Tiago Liasch/Thunder Fight

A dança esquisita e a brincadeira de gato e rato

Os lutadores tocam as luvas, acenam em sinal de que a porradaria já pode começar e passam a se movimentar pelo octógono como dançarinos de uma dança esquisita. Eles se olham fixamente, a guarda levantada na altura do queixo, mas durante os primeiros dois minutos de luta seus socos e chutes acertam apenas o ar.

Quemuel tenta um chute de carateca, e Acácio desvia com facilidade. Acácio faz seu braço pesado cair com força em direção ao peito do rival, que vira o corpo como em sincronia. “Ele não pode me derrubar”, pensa Acácio porque é isso que ele vem pensando o mês inteiro. Faixa-branca em jiu-jitsu, ele sabe que ir ao chão com Quemuel significa derrota praticamente certa. “Ele não vai me derrubar…”

Tiago Liasch/Thunder Fight

E então, Quemuel, mais leve e menor, agarra Acácio pela cintura, gira seu corpo no ar e o derruba com força no chão, imprimindo todo o seu peso sobre o adversário. Acácio responde com um esguicho de dor.

“Porra, Acácio!”, se desespera o treinador Magno Wilson e dá um soco no octógono.

Essa queda ajuda Quemuel a vencer o primeiro round. No segundo e no terceiro, Acácio consegue equilibrar a luta acertando bons chutes na coxa do rival, que tem dificuldade em responder. Durante muito tempo, os dois reencenam uma curiosa brincadeira de gato e rato: enquanto Quemuel tenta a todos os custos jogar Acácio no chão para finalizá-lo, Acácio luta para se manter em pé e despejar sua energia em forma de socos, chutes e joelhadas.

“Komodo, komodo, komodo”, canta uma parte da torcida. “Acácio, Acácio”, responde outra.

Os dois se agridem, se machucam, apanham, exibem um sofrimento dolorido a cada golpe certeiro, mas na volta de cada intervalo se abraçam fraternalmente para deixar claro que aquilo não é nada pessoal, eles são apenas lutadores fazendo seu trabalho.

Tiago Liasch/Thunder Fight

E então a corneta de ar soa pela última vez e o combate chega ao fim. Os dois estão de pé, os dois acham que venceram. Quemuel levanta os braços comemorando sua pretensa vitória. Acácio se joga ao chão de joelhos para recuperar o fôlego. O árbitro os puxa pelos pulsos e os coloca lado a lado.

“E o vencedor, por decisão unânime dos árbitros, é…”, anuncia a locutora, estendendo o suspense ao máximo…

“Acácio Pequeno Santos!”

Quemuel estende a palma das mãos e vira o rosto e faz cara de quem pergunta: “É sério isso?”

Tiago Liasch/Thunder Fight

“O lutador da casa tinha que vencer mesmo”, diz indignada a irmã de Quemuel, se referindo ao fato de que o treinador de Acácio, Magno Wilson, também é o funcionário responsável por acertar as lutas do evento.

O vencedor recebe os protestos como se não fossem com ele. No vestiário, enquanto tira as luvas, ouve de um companheiro uma frase para resumir a polêmica: “Quem bate mais chora menos.”

Ainda sorrindo – Acácio está sempre sorrindo, exceto quando está desidratando dentro de um carro-estufa, mas principalmente quando acaba de vencer a luta mais importante da carreira – ainda sorrindo, Acácio me avista no vestiário e agradece. “Obrigado por ter vindo aqui para ver tudo isso”, diz ele. “Você acompanhou todo o processo, viu como é a nossa vida.”

Adriano Wilkson/UOL

Eu penso em Acácio sofrendo dentro daquele carro, perto de entrar em colapso, suas mãos desesperadas procurando um objeto inexistente no ar, seus olhos revirando em desespero. “Valeu a pena?”, pergunto.

Acácio apenas sorri, assentindo.

Adriano Wilkson

Do UOL, em São Paulo