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Dólar dispara a R$ 5,07, antes de decisão sobre juros no Brasil e EUA

Alta de 2,58% foi a maior valorização diária desde 22 de abril, data em que foi registrado o salto mais intenso desde o início da pandemia

Moeda norte-americana teve a maior queda diária em três meses 

O dólar disparou neste início de semana e fechou acima de R$ 5,00 pela primeira vez desde 18 de março, em meio à onda de fortalecimento global da moeda americana.

À cautela em torno da decisão de política monetária do Federal Reserve (Fed, o banco central norte-americano) na quarta-feira que pode trazer um tom mais duro, somaram-se temores de desaceleração da economia mundial em momento de inflação elevada, a chamada estagflação.

Dados de atividade industrial abaixo do esperado nos Estados Unidos e, sobretudo, na China assustaram os investidores. Os lockdonws prescritos pela política de covid zero no gigante asiático traçam um cenário ruim para commodities, levando a uma queda em bloco das divisas emergentes.

Por aqui, a moeda operou com sinal positivo desde a abertura e superou a barreira dos R$ 5,00 já na primeira hora de negócios. A onda compradora se acentuou ao longo da tarde com a piora do ambiente externo. A taxa da T-note de 10 anos atingiu 3% pela primeira vez desde 2018 e o índice DXY – que mede o desempenho do dólar frente a uma cesta de seis divisas fortes – escalou até os 103,747 pontos.

Com renovação sucessiva de máximas ao longo da tarde, o dólar correu até R$ 5,0875. No fim do dia, com a virada das bolsas americanas para o positivo e a diminuição das perdas do Ibovespa, o dólar desacelerou os ganhos e encerrou o primeiro pregão de maio em alta de 2,63%, a R$ 5,0727 – maior valor de fechamento desde 17 de março (R$ 5,0343).

A desvalorização da moeda americana no ano, que chegou a superar 17%, voltou a ser de um dígito (-9,02%). O real liderou nesta segunda as perdas entre divisas emergentes, seguido pelo rand sul-africano, com baixa na casa de 2%, e pelo peso chileno e colombiano, que caíram mais de 1%.

Apesar da escalada do dólar, o Banco Central não deu às caras no mercado nesta segunda, talvez porque o movimento de valorização da moeda americana tenha sido global e não tenha havido “disfuncionalidade” na formação da taxa de câmbio. As duas últimas intervenções do BC foram no dia 22 (venda de US$ 571 milhões em leilão à vista) e no dia 26 (venda de US$ 500 milhões em contratos de swap cambial).

Já está na conta do mercado que o Copom anuncie uma alta de 1 ponto porcentual da taxa Selic, para 12,75%, na quarta-feira à noite. Espera-se que o Banco Central deixe a porta aberta para uma elevação residual em junho, talvez de 0,50 ponto porcentual.

Embora a taxa real doméstica seja a maior do mundo (à exceção da Rússia) e o diferencial de juros interno e externo tenda a se manter ainda em níveis elevados, investidores se mostram cautelosos e evitam aumentar exposição à moeda brasileira no curto prazo, dada a incerteza no ambiente externo.

Lá fora, além da provável elevação da taxa básica em 50 pontos-base, o BC americano pode acenar um ajuste monetário rápido e intenso. Já é grande a especulação de uma elevação dos Fed Funds em 75 pontos-base em junho. Além de caminhar para pôr a taxa básica rapidamente no nível neutro (talvez até acima dele), o Fed deve começar a reduzir seu balanço patrimonial, o que significa tirar dinheiro do sistema.

“O dólar segue bastante pressionado, principalmente por conta da reunião do Fed nesta semana. Dados de renda e consumo nos Estados Unidos ainda estão em alta, gerando pressão inflacionária. O rendimento dos Treasuries continua a subir e o fluxo estrangeiro para a nossa bolsa mostra reversão”, afirma o economista Bruno Mori, da Planejar.

Entre os indicadores do dia, o índice de gerentes de compras (PMI, na sigla em inglês) da indústria dos Estados Unidos, medido pelo Instituto para Gestão da Oferta (ISM, na sigla em inglês), recuou de 57,1 em março a 55,4 em abril. O resultado contrariou a previsão de alta a 57,8 dos analistas. Apesar de vir abaixo do esperado, o dado mostra atividade em expansão.

A economista-chefe da Armor Capital, Andrea Damico, afirma que, com a economia americana aquecida e a inflação elevada, o Fed deve promover pelo menos quatro altas de 0,50 ponto dos juros nas próximas reuniões. Em seguida, deve desacelerar o ritmo para 0,25 ponto, levando os Fed Funds a 4% no fim do ciclo, “tendo em vista a necessidade de juros restritivos para combater a alta da inflação”.

Na China, às voltas com medidas de restrição para combater a covid-19, o índice de gerente de compras (PMI) industrial caiu de 48,1 para 46 em abril o nível mais baixo desde fevereiro de 2020, momento em que a pandemia do coronavírus tomava o mundo.

“O PMI da China foi anêmico. Essa política chinesa de covid zero está comprometendo as cadeias de suprimento. É mais um fator de aversão ao risco que favorece o dólar. Existe uma busca de proteção no mundo que gira muito entorno do ambiente inflacionário global. O mercado quer pistas de como os BCs vão atuar”, afirma o diretor de produtos de câmbio da Venice Investimentos, André Rolha.

Taxas de juros

Os juros futuros encerraram a sessão desta segunda-feira em alta forte, seguindo a pressão global na renda fixa neste começo de semana. No pior momento da sessão, os vencimentos mais longos de Depósito Interfinanceiro chegaram a saltar mais de 20 pontos-base.

A taxa do contrato de Depósito Interfinanceiro (DI) para janeiro de 2024 subiu de 12,582% a 12,680%. O janeiro 2025 avançou de 12,031% a 12,165%. E o janeiro 2027 saltou de 11,83% a 11,985%.

Mais sensível à política monetária local, que já está no fim de seu ciclo de ajuste, o janeiro 2023 passou de 13,038% a 13,080%. Em relatório enviado a clientes na tarde desta segunda-feira, o Barclays espera que o Comitê de Política Monetária (Copom) eleve a taxa Selic em 1,0 ponto porcentual, a 12,75%, na decisão desta semana e deixe a porta aberta para um novo ajuste em junho, “se necessário”.

A inflação pressionada e a piora das expectativas do mercado devem levar o Banco Central (BC) a adotar uma comunicação mais aberta para o próximo encontro, na avaliação do economista para Brasil do banco, Roberto Secemski.

Todo esse comportamento do DI esteve atrelado à escala dos juros globais, com o retorno da T-note de 10 anos e do T-bond de 30 anos superando a marca psicológica dos 3%. Horas antes do Copom, na próxima quarta-feira, o Federal Reserve anuncia sua decisão de política monetária nos Estados Unidos. O consenso do mercado é de uma elevação de 50 pontos-base do Fed Fund, mas é esperada uma comunicação dura por parte do presidente do BC americano, Jerome Powell, para mostrar o compromisso para debelar a inflação.

Aqui no Brasil, a aposta em mais 100 pontos-base da Selic é unânime. Antes da decisão sobre os juros, o mercado conhecerá na terça cedo os dados da produção industrial brasileira em março, para o qual o consenso aponta para uma desaceleração dos 0,7% de crescimento em fevereiro para 0,2% (pesquisa do Projeções Broadcast, com intervalo de -1,2% a 1,1%).

Nesta segunda-feira, o índice de atividade econômica do BC (IBC-Br) apontou para uma perda de tração da economia no segundo mês do ano, com alta de 0,34% na margem (menor que a mediana de 0,40%).

Bolsa

O mês de maio começou com mau agouro nos mercados globais, arrastando o Ibovespa de volta aos patamares de janeiro e minguando a alta do índice no ano. O cenário de elevação de juros nos Estados Unidos e aqui, na quarta-feira, que já prometiam deixar o mercado cauteloso nesta semana, se somou a dados piores que o esperado da indústria nos Estados Unidos, na Europa e, principalmente, na China, consolidando o ambiente de aversão a risco.

Com receio de que a atividade global já cambaleante seja ainda mais prejudicada pelo ambiente de aperto monetário e pelos novos lockdowns na China, os investidores retiraram recursos de ativos de risco e enxugaram investimentos em emergentes como o Brasil. Com isso, o Ibovespa encerrou o dia em queda de 1,15%, aos 106.638,64 pontos, nível não visto desde janeiro.

Na mínima do dia, chegou a tocar os 105.218,19 pontos, patamar no qual se manteve por boa parte da tarde. Já no fim do pregão, contudo, uma melhora dos índices em Nova York, que encerraram o dia positivos, levou a referência da Bolsa de volta aos 106 mil pontos.

“Hoje foi um resultado de um mix de coisas. Inflação altíssima no mundo, inclusive nos EUA, principal economia do mundo, e o ruído de que pode haver recessão com a retirada de estímulos à economia. Somado a isso tem a guerra, que gera impacto muito forte para a inflação mundial, principalmente energia. E para piorar, a China fechada por conta do covid. Foi a cereja do bolo”, aponta Lucas Mastromonico, operador de renda variável da B.Side Investimentos.

A derrocada desta segunda-feira, aliada à sucessão de baixas das últimas semanas, minguou os ganhos tidos neste ano pelo Ibovespa. Em 2022, o índice acumula alta magra de 1,73%. Ante o cenário de desaceleração chinesa, os ativos ligados a commodities entraram com força no vermelho nesta segunda-feira, com uma perspectiva que não só a oferta global de manufaturados vai ser negativamente afetada, com uma nova rodada de disfunções na cadeia de suprimentos, mas também a demanda por commodities, o que impacta diretamente o Brasil.

“Os últimos PMIs (índice de gerentes de compras da indústria) sugerem que a atividade teve um início mais fraco no segundo trimestre, à medida que os lockdowns na China levaram a uma forte queda na atividade lá. E os componentes que olham para o futuro – incluindo novos pedidos e novos pedidos de exportação – sugerem que a atividade vá enfraquecer mais”, aponta a consultoria britânica Capital Economics em relatório.

Os ativos ligados a commodities metálicas sofreram, com Vale em queda de 0,44% e Gerdau chegando a recuar 2,55% (PN). Além disso, nem mesmo o barril de petróleo acima dos US$ 100 foi suficiente para segurar as ações das petroleiras, com PetroRio figurando entre as maiores quedas da bolsa (-5,81%) e Petrobras terminando o dia em queda de 1,79% (ON) e 0,99% (PN). Somado à alta inflação interna e juros altos, varejo e techs também sofreram, além dos bancos, com a B3 capitaneando as perdas, com queda de 3,7%.

“Estamos vendo uma continuidade do que aconteceu na sexta-feira no fim do dia, setores mais cíclicos, tanto domésticos quanto globais, liderando a queda na bolsa. Isso é explicado pelo receio dos mercados por uma aceleração de juros nos Estados Unidos, um ciclo mais longo e talvez até mais acentuado nas próximas reuniões”, aponta Luiz Adriano Martinez, administrador de portfólio da Kilima Asset.

Na próxima reunião de política monetária americana, na quarta-feira, o mercado espera que o Federal Reserve suba os juros em 0,50 pontos, mas acredita que a atual conjuntura levará o banco central americano a deixar a porta aberta para altas mais agressivas.

Para Martinez, o comportamento do índice brasileiro em maio será ditado por dois fatores, sobretudo: o quão agressivo o Fed se propuser a ser e os sinais vindos da economia chinesa. “A maneira como a China está tratando a covid está prejudicando bastante a economia corrente. O que precisa ser definido é se essa piora é só restrita ao lockdown. Se num segundo momento, quando as medidas deixarem de ser implementadas, será que a economia volta com a mesma força de anteriormente?”, questiona.

Correio do Povo