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Dilma pede reforma tributária e chama de “selvagem” as alterações trabalhistas

Ex-presidente concedeu entrevista ao programa Esfera Pública, da Rádio Guaíba

 Foto: Alina Souza / CP

A ex-presidente Dilma Rousseff voltou a pedir nesta quinta-feira, em entrevista ao programa Esfera Pública, da Rádio Guaíba, que se faça, de maneira urgente, uma reforma tributária no Brasil. Segundo ela, é fundamental que os impostos, a alta tributação não sobrecarregue os pobres e a classe média. Dilma defende que os ricos paguem mais impostos. Ela lembrou que a CPMF, proposta pelo seu governo para voltar a ser cobrada, não foi aprovada porque os que detém as riquezas não querem ser descobertos pelas fraudes fiscais que realizam.

Ela lembrou o episódio do pato amarelo de borracha em frente ao prédio da Fiesp. O presidente da Fiesp, Paulo Skaf, colocou um pato amarelo no meio da avenida Paulista, em São Paulo, e estava escrito ‘Não queremos pagar o pato’. O que é ‘pagar o pato’ para eles? É pagar impostos. Então, no Brasil, temos um impulso muito grande para a fraude fiscal.

Dilma falou ainda sobre a reforma trabalhista, que considera uma “selvageria”, e pediu para que a população seja ouvida, através de plebiscitos em questões controversas. A ex-presidente negou que o Brasil esteja falido e lembrou que a política econômica implementada pelo governo Michel Temer criará dificuldades para o Brasil. Confira alguns trechos da entrevista e ouça na íntegra o programa:

Reforma tributária é extremamente necessária?

“O Brasil precisa urgente de uma reforma tributária. Dizem que no Brasil pagamos muitos e elevados impostos e é verdade, mas quem paga? Basicamente o trabalhador e a classe média. Pois os grandes beneficiados das riquezas, os que mais ganham e os que concentram riqueza, pagam poucos impostos. Nós somos um dos poucos países que não tributa sobre o rendimento que a pessoa obtém quando ela é sócia de uma empresa. Então, a renda decorrente da atividade econômica, da empresa, não é tributada. Então, hoje não se paga nenhum imposto sobre dos dividendos. O que é um absurdo sobre ganhos de capital. O Brasil tem um nível de isenção muito elevado. Por exemplo, grandes fortunas e heranças não são tributadas. Temos grandes dificuldades de passar qualquer lei que implique em pagamento de imposto para os muito ricos. Então, é sobre os ombros dos pobres e da classe média são os que recaem o pagamento de tributos.”

“O presidente da Fiesp, Paulo Skaf, colocou um pato amarelo no meio da avenida Paulista, em São Paulo, e estava escrito ‘Não queremos pagar o pato’. O que é ‘pagar o pato’ para eles? É pagar impostos. Então, no Brasil, temos um impulso muito grande para a fraude fiscal. Aliás, fizeram campanha para não pagar a CMPF. Ela é um exemplo disso, pois é 0,38% a alíquota sobre transação financeira. Sempre lembrando que salários baixos e aposentadorias não seriam tributados, mas uma transação de R$ 100 milhões pagava 0,38% de tributo. Não era pelo montante que seria pago, era fundamentalmente porque, quando você tributa a situação financeira, o seu controle sobre evasão fiscal e fraude fiscal, não pagamento deliberado de imposto, ficam muito forte o controle da Receita Federal. Então, é óbvio que não querem pagar, mas sobretudo também não querem que você saiba onde está tendo a evasão. O mundo inteiro tributa ganho de capital. A não tributação é que explica a grande concentração de riquezas.”

Porque não fez a reforma tributária?

“Todas as vezes que tentamos mandar, eles devolviam dizendo que tinham falhas técnicas ou simplesmente engavetavam, quando ficava muito claro que não era isso. Os meus críticos ou desconhecem a composição conservadora e hegemonizada pela extrema-direita do Congresso, ou são mal informados, pois nós tentamos várias vezes. Não só eu, mas o presidente Lula também. Essa questão da concentração é gravíssima. Ninguém no Brasil toca neste assunto. É proibido. É vetado. Principalmente, neste Congresso. É necessário uma grande campanha de esclarecimento para a população, já que a CPMF incide mais sobre as grandes transações”.

Reforma trabalhista “selvagem

“O Brasil vai precisar de uma reforma política e que certas coisas tenham consultas, senão, não passarão. Hoje estão querendo fazer a reforma, que acho a mais violenta. A trabalhista tem um componente retrógrado que nem a ditadura militar ousou fazer. Tentaram acabar com a proteção de direitos trabalhistas, mudaram muitas coisas, mas jamais na proporção que estão tentando hoje. Fiquei escandalizada com a mudança que pode colocar mulheres gestantes a trabalhar em locais insalubres e que ameaçam a sua saúde. Instauramos a selvageria de um tempo de trabalho ilimitado. Selvageria de não haver previsão contratual de quando o contrato começa. Deixa uma relação desigual entre o patrão, com toda a sua força, e o empregado, individualizado. Deixa desprotegido quem que é hipossuficiente contra o extremamente forte pela ação regulatória do Estado, que equilibra essa relação. Há estudos em muitos países que provam que a desregulamentação do trabalho não cria mais investimentos, mas deprime a economia. Porque reduz o montante da renda nacional, que é atribuído ao salário. Além disso, permite que haja um nível de incorporação da margem de lucro e não necessariamente um aumento do investimento e da capacidade produtiva de um país”.

Privatizações e o fim da obrigação de investimentos na indústria nacional

“Acredito que estamos diante de uma situação muito grave, pois estão querendo voltar aos anos 80. Querem reduzir o ganho que tivemos durante esse período com uma alegação, que o Brasil está quebrado. Não estamos quebrados. Ao contrário. Tanto que nós salvamos o Brasil da inadimplência. Quando o Lula chegou ao governo, o Fernando Henrique devia algo em torno de 16 ou 18 bilhões de dólares, mas tínhamos muito menos reserva que este valor. Até a minha saída do governo, e eles não tiveram tempo suficiente para destruir isso, tínhamos em torno de 380 bilhões de dólares de reservas. Um país não está quebrando com uma montanha dessas de reservas. Mais somos credores líquidos internacionais. O Fundo Monetário mandava e desmandava na política macroeconômico quando Fernando Henrique era presidente. Nós pagamos o FMI e passamos a emprestar para eles, em determinado momento”.

Correio do Povo