Diário de uma coroa
Bem conservada!
Tem um momento da vida que a gente passa a ouvir: “nossa, como estás bem conservada!”. Nesse exato momento ouvimos soar o gongo, uma batida surda, um sinal de alerta, um aviso delicado de que já passamos para o outro lado da curva, onde nos aguarda um perau sem fim.
Conforme-se. Isso será tudo que ouvirás daí para a frente.
Enquanto somos jovens os elogios são outros.
À medida que envelhecemos os elogios são direcionados a preservar a imagem do que já fomos um dia, ou a imagem que os amigos guardaram de nós.
Sempre que ouço “bem conservada”, sorrio por dentro, pois meu cérebro inconvenientemente, me remete ao porão de nossa casa onde eram guardadas as conservas para o uso da família ou aos tanques de formol da faculdade e, inevitavelmente, passo a fazer associações no mínimo bizarras.
Se formos conservados no vinagre, seremos velhos amargos, rabugentos, ranzinzas por opção, criaturas de quem todos fogem na primeira oportunidade.
Se formos conservados no formol, seremos eternas “múmias paralíticas” infernizando a vida de todos.
Porém, se formos conservados no álcool, ou melhor no vinho ou no seu parente próximo, o espumante, que com seu ingrediente quase medicinal, o resveratrol, fazem bem à saúde e à alma, seremos criaturas de bem com a vida, que trazem alegria e mostram um mundo melhor.
Não quero ser como um vidro de pepinos em conserva, que já tem um ano, mas parece que foi feito ontem.
Não quero ser como um corpo em um tanque de formol, eternamente com a mesma aparência, sem nenhuma marca do que foi em vida.
Escolho ser como um bom vinho que envelhece com sabedoria, ciente que tudo tem seu tempo e que devemos saborear cada gole que nos é oferecido, com prazer, pois ele é único e não deve ser desperdiçado.
Em vez de ser bem conservada, quero ser reconhecida por conservar alegria de viver até o fim.
Viviane M Foresti
