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Carazinho – Empresa gaúcha provoca prejuízos de Norte a Sul do Brasil

Uma fábrica de Carazinho, no RS, é alvo da indignação de dezenas de clientes, de todas as regiões do país

Clientes afirmam ter caído em golpe ao comprarem máquinas para produção de gelo

Uma fábrica de Carazinho, no RS, é alvo da indignação de dezenas de clientes, de todas as regiões do paísAcervo Pessoal/Divulgação

Jônatha Bittencourt jbittencourt@band.com.br

Uma fábrica de Carazinho, no Rio Grande do Sul, é alvo da indignação de dezenas de clientes, de todas as regiões do país, que estão convencidos de terem caído em um golpe.

 

A sistemática adotada pela empresa Harbord costuma ser a seguinte:

 

1) Oferece condições vantajosas para a aquisição de máquinas para produção de gelo;

 

2) Entrega em partes, com peças inutilizáveis, velhas ou em falta;

 

3) Os clientes, ao perceberem que não receberam o que foi negociado, deixam de pagar;

 

4) A empresa protesta os valores pendentes, deixando os compradores com o “nome sujo”.

 

5) Muitos não conseguem mais se reerguer financeiramente.

 

Jackson Yamaga é de Belém do Pará. Ele pediu uma máquina que fabricasse seis toneladas de gelo por dia. O valor do negócio: R$ 90 mil. Segundo Jackson, a empresa ficava apenas na promessa de entrega. “Paguei uma parcela maior para que me enviassem a máquina. Aí me mandaram uma pequena primeira parte”, destaca. “Fomos discutindo até que me pediram mais R$ 25 mil para enviarem o restante. Paguei, mas só veio sucata”.

 

Percebendo que estava pagando por algo que, além de não funcionar, não era a máquina negociada, Jackson parou de pagar. A Harbord protestou o que ainda faltava ser pago. “As minhas contas foram todas bloqueadas por causa deles. Entraram com um processo contra mim, pegaram parte do dinheiro da minha conta, que está em juízo”, explica.

 

“Não deixei nem descer aquilo do caminhão!”

 

Comprador de Mirante da Serra, Rondônia, Sandro Luiz Ferrari foi informado de que receberia a máquina de gelo em 180 dias. O prazo venceu e a empresa de Carazinho deu inúmeras desculpas pelo atraso. Sandro resolveu cobrar o equipamento na Justiça e explica que o “juiz determinou que pagassem uma multa de R$ 1.000,00 por dia de atraso”.

 

“Para pararem de pagar, juntaram uma sucata que não tinha nada a ver com fábrica de gelo, colocaram num caminhão e mandaram pra cá. Só que não deixei nem descer aquilo do caminhão! Chamei três testemunhas – inclusive o próprio motorista do frete deles –, fizemos um termo de devolução e mandei a máquina de volta.”

 

No entanto, o relatório de devolução foi desconsiderado pela Harbord, que cobrou o restante do pagamento integralmente. Sandro entrou na Justiça pedindo indenização por danos morais, que foi fixada em R$ 15 mil. A Harbord ainda pode recorrer da decisão.

 

Uma das testemunhas arroladas no processo foi um técnico em refrigeração contratado para fazer a instalação da máquina com as peças recebidas. No depoimento, ele afirma que o equipamento apresentava várias irregularidades e não era novo. Partes foram encontradas quebradas, incluindo o compressor e o motor elétrico.

 

 

Sandro garante ter feito vários investimentos em infraestrutura para receber o maquinário. Desde aquela época, amarga prejuízos.

 

“Naquele momento, minha filha estava cursando Medicina. Não deu mais para pagar. Na época, meu pai teve um AVC e não consegui mais ajudar”, relata. “Até hoje tenho meu nome sujo, não consigo mais fazer compras grandes ou obter crédito. Não posso usar banco, minha vida virou uma bagunça”.

 

Comprador desconfiado vai até Carazinho

 

Marcelo Martins da Silva é de Dourados, no Mato Grosso do Sul, e resolveu comprar uma máquina seminova que produzisse nove toneladas de gelo por dia. Quando o prazo chegou, percebeu que estava sendo “enrolado” e foi até o Rio Grande do Sul, mais de 900 km de viagem.

 

“Cheguei lá e não tinha nada pronto. Pensei: ‘Se eu levar alguma coisa daqui vai ser melhor do que nada’. Eu já tinha uma pequena noção de refrigeração”, explica.

 

Foram duas viagens para levar várias peças para o Mato Grosso do Sul. A máquina não funcionou, precisou de muitos ajustes. Além disso, Marcelo precisou enfrentar as restrições de crédito.

 

“O meu nome ficou sujo. Como eu tinha restrição no Serasa, as empresas de quem a gente comprava embalagens, produtos de limpeza… lascou (sic) tudo. Gastei muito dinheiro: foi na máquina, depois para fazer funcionar, com profissionais para mexer no equipamento…”, afirma o sul-mato-grossense.

 

“Aquele dinheiro foi indo, foi indo, foi indo… Aí eu quebrei.”

 

“A pior coisa é quando roubam teu sonho”

 

Não faltam reclamações contra a empresa Harbord em sites da internet como o Reclame Aqui. Revoltados com o que classificam de golpe, dezenas de clientes decidiram se unir contra a fábrica até mesmo em um grupo no Whatsapp. São pessoas de, no mínimo, 10 estados das cinco regiões do país.

 

Carlos Tabosa, do Pará, estima ter tido um prejuízo superior a R$ 600 mil, incluindo os gastos em infraestrutura para receber a máquina, o valor do equipamento que não funcionou e despesas com financiamento bancário.

 

“Entreguei para o banco alguns caminhões que eu precisava quitar. Vendi barato todo o resto da frota. Mudamos toda uma infraestrutura: contratamos guindastes, fizemos trapiche na região, mudamos o padrão da comunidade (porque era uma vila de pescadores), compramos transformador. Foi um custo altíssimo decorrente de todas as economias da minha família.”

 

Carlos também deixou de pagar por não receber o negociado, por causa disso ficou com o “nome sujo”, o que teria prejudicado, inclusive, os cuidados com o pai, que teve um AVC. O paraense relata que precisou sair de casa para morar num apartamento. De empresário, Carlos se transformou em um vendedor de lanche na BR-316.

 

“Tiraram qualquer possibilidade de eu e minha família nos recompormos financeiramente. Se tu roubar (sic) meu dinheiro, isso não me afeta, não. Porque a gente, que trabalha, sabe como ganhar. Com 47 anos de idade que tô (sic), a pior coisa do ser humano, meu amigo, pelo menos para mim, é quando roubam teu sonho.”

 

“Quando fui dar banho no meu pai – porque ele não falava, não andava – e vi ele nu pela primeira vez, eu chorei de vergonha”, relata, emocionado, Carlos Tabosa.

 

Ligando para a Harbord

 

Tomando o conhecimento da experiência de vários compradores, entramos em contato com a Harbord, de Carazinho, no Rio Grande do Sul. Um dos principais vendedores, Rafael Pereira, atendeu.

 

Vendedor: Financiamento próprio, 45% de entrada e o restante podemos parcelar de 10 a 25 vezes no boleto sem juros. Máquina totalmente nacional, completa. A única parte que mandamos revisada é o compressor, o restante todinho (sic) novo. Garantia de dois anos.

 

Repórter: Pesquisei na internet e encontrei muitas reclamações. Elas procedem?

 

Vendedor: (silêncio)

 

O telefone é desligado.

 

Entramos em contato, novamente, mais tarde. Rafael explica que depois dos problemas registrados, a forma de negociação mudou. Além disso, o vendedor afirma que outras empresas também constam na internet como alvo de reclamações.

 

A Harbord responde a alguns processos. Tentamos contato com a advogada que defende a empresa, mas nenhuma das ligações foi atendida.

 

Além das ocorrências que foram registradas por compradores, a Polícia Civil tomou conhecimento do caso através da equipe de reportagem. Apesar dos negócios fechados resultarem em prejuízos de milhares de reais, a esperança dos clientes por Justiça permanece, como afirma o paraense Carlos Tabosa: “Ainda existe justiça. Pode demorar, mas ela vem”.

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