Nesta quarta, plenário se reúne novamente para avaliar decisão do presidente da Corte, que autorizou a assinatura do contrato
Com maioria formada a favor da anulação do leilão da Companhia Riograndense de Saneamento (Corsan), a 1ª Câmara do Tribunal de Contas do Rio Grande do Sul (TCE) suspendeu o julgamento, depois de mais de cinco horas de sessão, na tarde desta terça-feira.
Nesta quarta, o Pleno volta a se reunir, em sessão híbrida, para examinar a decisão do presidente do TCE, conselheiro Alexandre Postal, de suspender a cautelar da conselheira relatora do processo, Ana Moraes – o que possibilitou a assinatura do contrato de venda da companhia, em 7 de julho.
Na sessão desta terça, a conselheira apontou inconsistências na elaboração dos estudos que estabeleceram o preço de venda da Corsan, entendendo haver subavaliação, entre outras irregularidades.
Ana Cristina Moraes votou pela anulação do leilão, ocorrido em 2022, e defendeu que o certame seja repetido somente após a correção dos valores, além de outras medidas que envolvem políticas de saneamento básico e esgotamento. O presidente da 1ª Câmara do TCE, conselheiro Estilac Xavier, acompanhou o voto da relatora.
Ana Moraes sintetizou o relatório de mais de 370 páginas em 1h20min. Ela disse ter condensado 10% do voto e não ter entrado no mérito político da decisão do Executivo, endossada pelo Legislativo, pela privatização. A conselheira salientou, porém, que esse tipo de operação precisa respeitar as regras, e ressaltou que a “sociedade é a maior interessada no desfecho do presente processo”.
Segundo a conselheira, as empresas de consultoria erraram nas projeções de EBITDA, indicador usado para avaliar a saúde financeira de empresas, e de lucro líquido da Corsan. Ela apontou ainda que havia tempo hábil para atualização no edital do leilão, o que não ocorreu. Ana também chamou de “atropelos” as decisões jurídicas que permitiram a assinatura do contrato em 7 de julho.
O conselheiro Estilac Xavier elogiou o voto da conselheira, a quem chamou de “competente e isenta”, os demais consultores que se debruçaram sobre o processo, o trabalho do Ministério Público de Contas e da área técnica do Tribunal. Xavier também classificou a decisão do presidente do TCE, Alexandre Postal, que permitiu a assinatura do contrato de venda, de “equivocada e ilegal” ao derrubar cautelares, mas reconheceu que o assunto está superado, já que a venda se concretizou.
Pedido de vista
Para o conselheiro Renato Azeredo, a complexidade da matéria exige discussão no pleno da Corte. Ele disse não recordar de uma pauta dessa relevância apreciada em uma câmara e pediu vista do processo alegando que o voto da relatora só apareceu no sistema corporativo da Corte na noite do último dia 10. Azeredo alegou não ter havido tempo hábil para a interpretação total da matéria, devido a pautas do pleno e à análise das contas do governador.
Ana Cristina rebateu afirmando que uma matéria de envergadura tão grande quanto, que envolvia a extinção de fundações estaduais, traçou o caminho inverso, sendo encaminhada do Pleno para a 1ª Câmara, e defendeu a competência para o julgamento. Jà Estilac Xavier disse achar “natural” o pedido de vista, embora tenha reforçado que todos os conselheiros dispõem de equipes para avaliar os processos antes de externar o voto.
Sigilo
Ao analisar o segundo processo da pauta do dia na 1ª Câmara, relativo à manutenção do sigilo sobre a avaliação do valor de venda da companhia, a relatora suspendeu o julgamento. Ana Moraes justificou a medida como necessária para que ela possa analisar um termo do regimento interno da Corte, levantado pelo advogado do consórcio Aegea e pela Procuradoria-Geral do Estado, apontando que a competência sobre manter ou retirar o sigilo deve ser do Pleno do TCE e não da 1ª Câmara.
Sindicatos se manifestaram
Advogados do Sindicato dos Engenheiros (Senge-RS), do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras das Indústrias de Purificação e Distribuição de Água e Serviços de Esgoto do RS (Sindiágua-RS) e dos deputados Jeferson Fernandes, Miguel Rossetto e Zé Nunes, da bancada do PT na Assembleia Legislativa, realizaram sustentação oral, apontando o que entendem ter sido irregularidades no processo de licitação. A principal questão fazia referência ao preço da venda por R$ 4,151 bilhões, 1,15% acima do lance mínimo fixado pelo governo, e a definição do valor através de consultorias sem licitação.
“Estamos tratando exatamente da utilização consciente e deliberada de fórmulas, critérios e cálculos matemáticos e financeiros, cuidadosamente escolhidos por empresas especializadas, para reduzir o preço e avaliação da Corsan”, disse o advogado do Sindiágua-RS. Antônio Castro definiu o valor da venda como “preço de banana” e pediu anulação da privatização. Os sindicatos defendem que o valor correto da autarquia, com base em cálculos próprios, era próximo de R$ 7 bilhões.
PGE considera avaliação de preço chancelada
Representante da Procuradoria-Geral do Estado, o procurador-geral adjunto para Assuntos Jurídicos, Vitor Herzer da Silva, rebateu a posição. “O valuation (avaliação do valor de mercado da Corsan) e a consequente definição do preço mínimo foram fixados depois de um trabalho de meses de consultorias especializadas”, ressaltou.
O procurador-geral do Ministério Público do RS (MPC-RS), Geraldo da Camino, negou que o órgão que comanda tenha “lado” e disse que defende a lei. Ele reforçou que o principal argumento para solicitar a suspensão do processo de privatização está relacionado à cobertura de esgoto, cuja avaliação embasou os valores necessários em investimento e, consequentemente, a composição do preço da empresa.
Pedido para o Pleno negado
Antes do julgamento do mérito do processo que envolve a privatização da Corsan, a sessão da 1ª Câmara do TCE-RS apreciou uma questão de ordem, que pedia a declaração de incompetência do colegiado para o julgamento, e a transferência da análise para o Pleno do Tribunal. A solicitação partiu do advogado do consórcio Aegea, Rafael da Cás Maffini, sendo defendida pelo representante da PGE.
Presidente da Câmara, o conselheiro Estilac Xavier indeferiu o pedido, seguindo entendimento da conselheira-substituta Ana Moraes e do procurador-geral do MPC, Geraldo da Camino. Já o conselheiro Renato Azeredo teve o voto vencido.
*Com informações do repórter Felipe Nabinger/Correio do Povo